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A CRISE NA CADEIA DE SUPRIMENTOS GLOBAL

No relatório encomendado pela Alcoa Foundation e confeccionado pelo CSIS – Center for Strategic & International Studies (CSIS na sigla em inglês), os autores William Reinsch e Emily Benson trazem à luz da geopolítica um elemento novo de modulação no mundo pós-pandemia: Os desafios para a cadeia de suprimentos globais com a retomada da economia.


Por definição, para os pesquisadores, a resiliência da cadeia de suprimentos é medida pela capacidade dos abastecimentos de resistir e responder as interrupções, minimizando o tempo necessário para recuperar a capacidade operacional. Por outro lado, a realocação, em certo momento ocorre quando os fornecedores reduzem sua dependência das cadeias de suprimentos externos movendo a produção para dentro das fronteiras domésticas.


Dentro deste espectro, o dilema tornou-se superar as adversidades oriundas da SARS-CoV-2 e restabelecer quais respostas o segmento industrial será capaz de oferecer para mitigar o problema do Supply Chain global.


Como parte a crítica ao cenário atual, o laureado com o prêmio Nobel de Economia de 2001 e autor do livro: “The Next Convergence: The Future of Economic Growth in a Multispeed World”, Michael Spence, conduz uma análise em que a maioria das projeções feitas a partir do primeiro trimestre de 2021, de aceleração do crescimento econômico poderia colocar pressão sobre a oferta e que, por conseguinte, causaria efeitos pouco sustentáveis.


Ainda de acordo com o economista, apoiado por outros macroeconomistas influentes, alertou sobre a combinação de política monetária voltada à acomodação, saldos elevados de poupança das famílias, demanda reprimida, novas formas de consumo e gastos fiscais maciços que poderiam ocasionar um risco elevado de inflação, alimentada por uma importante liquidez e por preços superficiais de ativos que eventualmente poderiam ultrapassar a oferta, embora a duração do desequilíbrio seja desconhecida e as interrupções na oferta possam ser classificadas como transitória.


Entretanto, apesar dos observadores econômicos estarem convencidos de que este é o caso, os membros ativos da cadeia de suprimentos têm uma visão de que a escassez, os atrasos e desequilíbrios entre oferta e demanda continuarão em 2022, ou até 2023.


Na busca por respostas, especialistas consultados acreditam que a crise no fornecimento de produtos e mercadorias está atrelada ao fato da demanda reprimida ter sido liberada antes da pandemia de fato acabar, ou seja, à medida que a demanda cresceu, as interrupções e restrições relacionadas à pandemia continuaram a afetar os principais portos e fábricas, amortecendo a resposta da oferta.


Outro fator analisado é sobre a possibilidade da demanda ter subido além da capacidade máxima de carga do sistema. Ampliar essa capacidade exige investimentos pesados e tempo, embora a capacidade de carga máxima seja crucial em serviços como de energia, é menos importante para as mercadorias, para a qual a demanda deve ser gerenciada por um sistema que funcione suficientemente bem para antecipar eventuais desequilíbrios no fluxo de encomendas.


Nesse sentido, para observadores e especialistas é justamente a sistemática e o gerenciamento que tornam o desafio mais complexo – as redes globais de abastecimento, na formatação atual são descentralizadas e costuradas, a fim de maximizar a eficiência e minimizar o desperdício, o que acarreta resultados satisfatórios em tempos normais, mas não apresenta soluções em períodos de grandes choques ou perturbações mais longevas, desta forma, na estrutura atual não há um conjunto de modelos que permita prever com alguma precisão de que modo tais tendências podem afetar elementos específicos das cadeias de suprimentos, como por exemplo, onde novos gargalos ocorrerão e muito menos como os atores mercadológicos devem ajustar seu comportamento.


Levantada a conjuntura é importante ilustrar o cenário com o exemplo das duas principais economias do sistema internacional: Estados Unidos e China.


Nos EUA, o problema na cadeia de suprimentos é emergente e sem precedentes, a ponto da Casa Branca destacar uma equipe de trabalho para desbloquear os embarques na Costa Oeste. Os portos de Los Angeles (POLA) e Long Beach (POLB), os mais afetados pela crise, são juntos o maior complexo portuário do país e servem como porta de entrada para 40% de todas as importações marítimas dos EUA.


O complexo portuário de Los Angeles forma o maior centro de embarque no hemisfério ocidental e é o principal portal de embarque dos EUA para a Ásia, com mais de 90% da carga movimentada vindo do nordeste e sudeste asiático.


Ambos os portos da costa oeste são um canal vital para importação de petróleo, móveis, automóveis e componentes, assim como de vestuário e eletrônicos, além de serem responsáveis pela saída de derivados de petróleo, produtos químicos e agrícolas.


Em tempos mais recentes, a partir da década de 1980, a proliferação do comércio resultante do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT na sigla em inglês) em adição aos tratados de comércio bilaterais com Hong Kong, Japão, Taiwan e China rendeu um aporte significativo na chegada de containeres por ano, o que ajuda a entender o tamanho que o sistema portuário se tornou. A adesão da China à Organização Mundial do Comércio (WTO na sigla em inglês) em 2001 aumentou ainda mais as chegada de navios, fazendo com que POLA se tornasse o porto mais movimentado dos EUA.


Na administração de Joe Biden, a cadeia de suprimentos, o que inclui a resolução dos gargalos em POLA e POLB, passou a ser uma prioridade na agenda de política interna. O presidente Biden estabeleceu uma força tarefa liderada pelos Secretários de Comércio, Transporte e Agricultura com o intuito de produzir soluções de curtíssimo prazo.


Em meados de outubro de 2021, compromissos foram anunciados para expandir as equipes de descarregamento em POLA, além de ampliar os turnos para 24h nos sete dias da semana.


No entanto, estimativas apontam que tais movimentos seriam capazes de mover apenas 3.500 containeres adicionais por dia até o final do ano, uma fração do que um grande cargueiro pode conter.


Por outro lado, o governador da Califórnia, o democrata Gavin Newson, assinou uma ordem executiva suspendendo os regulamentos de transporte de peso de containeres e abrindo armazéns estaduais para conter a escassez de armazenamento, outro dos gargalos que surgiram na crise dos containeres.


Para o longo prazo, a Casa Branca e a Casa dos Representantes propuseram investimentos na ordem de US$ 17 bilhões em infraestrutura portuário, o que resultaria também em melhorias nas ferrovias e rodovias do país. Os investimentos visam também a descarbonização, visto que as emissões de CO2 relacionadas aos portos continuam a aumentar muito acima de outros setores.


Embora ações de curto e longo prazo possam auxiliar no desenvolvimento, analistas consultados vêem POLA e POLB também como ineficientes em comparação a outros portos do mundo.


De acordo com o Índice de Desempenho de Portos de Containeres (CPPI na sigla em inglês) do Banco Mundial, Los Angeles e Long Beach estão na posição 337º e 341º respectivamente, em grande parte, ainda segundo analistas, a resistência à automação e às operações 24/7. Em comparação, a classificação CPPI do Porto de Shanghai é 47º e pode processar containeres duas vezes mais rápido que POLA durante tempos normais.


Na China, o cenário não está diretamente relacionado à sua infraestrutura, mas sim a crise de energia, do agravamento do endividamento do setor imobiliário, novos surtos de coronavírus, além de gargalos logísticos, com escassez na produção de semicondutores e custos mais altos de frete e matérias-primas - fatores estes que proporcionaram a desaceleração da economia, com o PIB crescendo “apenas” 4,9% de julho a setembro, o ritmo mais fraco desde o terceiro trimestre de 2020 e desacelerando 7,9% em relação ao segundo trimestre.


O gigante asiático ainda enfrentou uma retomada tímida da atividade manufatureira, depois de 2020 o país permanecer fechado devido ao surto de COVID-19, 2021 apresentou recuos devido a cortes de energia causados por restrições ao uso de eletricidade.


O porto de Yantian permaneceu com atividade restrita por quase dois meses, de maio a junho de 2021, enquanto Ningbo foi encerrado brevemente em agosto devido a surtos do novo coronavírus.


Com um cenário também adverso, companhias instaladas no país asiático estão revisando seus lucros devido a atrasos no envio e à escassez de matéria-prima. Fabricantes de brinquedos, eletrônicos, automóveis, equipamentos médicos e de dispositivos diversificados argumentam que as restrições na oferta e a crise logística culminaram no cenário que afeta toda a cadeia globalizada.


Em contrapartida, empresas logísticas como a chinesa COSCO relataram aumento do lucro líquido de 69,59 bilhões renminbi nos primeiros meses de 2021, duas vezes a soma desde 2002. A China International Marine Containers Group angariou com a crise um lucro líquido nos três primeiros trimestres de 8,799 bilhões renminbi, 10 vezes em relação a 2020. Já o Shanghai International Port Group, administrador de terminais portuários lucrou 11,74 bilhões renminbi, 95,39% em comparação ao ano anterior, o melhor desempenho da história.


Entre perdedores e ganhadores, o saldo é preocupante quando se observa que poucos atores conseguem monetizar com a crise instalada o que pode elevar a escalada de tensões entre Washington e Beijing a outro nível.




Victor José Portella Checchia é formado em Relações Internacionais pela Faculdades de Campinas (FACAMP), com pós-graduação em Direito Internacional pela Escola Paulista de Direito (EPD). Atuou como articulista em Política Internacional para o Centro de Estratégia, Inteligência e Relações Internacionais (CEIRI) ao longo de quatro anos. Teve passagens pela Prefeitura Municipal de Campinas, na antiga pasta de Cooperação Internacional, hoje Secretaria de Desenvolvimento Econômico. Tem experiência em questões relacionadas o Comércio Exterior, no atendimento a clientes internacionais, projetos de internacionalização de empresas, cooperação econômica e paradiplomacia.


BIBLIOGRAFIA.


https://www.csis.org/analysis/manufacturers-dilemma-reshoring-and-resiliency-pandemic-world


https://www.project-syndicate.org/commentary/prevent-future-supply-chain-disruptions-using-ai-models-by-michael-spence-2021-11/portuguese


https://www.csis.org/analysis/no-escape-la-lingering-supply-chain-insecurity-los-angeles-ports


https://www.theguardian.com/business/2021/oct/20/supply-chain-crisis-california-ports-cargo-ships


https://www.nytimes.com/2021/10/18/us/port-of-los-angeles-supply-chain.html


https://businessofhome.com/articles/why-experts-say-the-shipping-crisis-won-t-end-until-2022-at-the-earliest


https://www.portoflosangeles.org/business/statistics/facts-and-figures


https://www.portoflosangeles.org/about/history


https://www.kcet.org/shows/departures/brief-history-of-the-ports-of-los-angeles-and-long-beach


https://www.weforum.org/agenda/2019/02/visualizing-the-world-s-busiest-ports


https://www.whitehouse.gov/briefing-room/statements-releases/2021/06/08/fact-sheet-biden-harris-administration-announces-supply-chain-disruptions-task-force-to-address-short-term-supply-chain-discontinuities/


https://www.whitehouse.gov/briefing-room/statements-releases/2021/08/27/white-house-announces-john-d-porcari-as-port-envoy-to-the-biden-harris-administration-supply-chain-disruptions-task-force/


https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2021/11/gargalos-na-industria-podem-durar-ate-2023-com-freio-da-china-dizem-analistas.shtml


https://thediplomat.com/2021/11/chinas-supply-chain-bottlenecks-winners-and-losers/


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