A importância do Mar do Norte no cenário energético europeu
Luis Augusto Medeiros Rutledge* novembro/2022
Países da União Europeia veem encontrando imensas dificuldades para aumentos expressivos da oferta importada de gás natural após a guerra da Ucrânia. Questões geopolíticas ou de infraestrutura são os principais impedimentos verificados pelos líderes europeus na busca desenfreada por um maior suprimento energético. Países da União Europeia necessitam de estoques de gás para suportar a alta demanda imposta pelo inverno europeu e para alimentar a infraestrutura industrial que faz uso do gás natural como sua fonte energética principal.
No campo geopolítico se verificou que os membros da Opep+ tendem a manter um posicionamento conjunto no corte da produção de petróleo e gás natural e não irão ceder aos pedidos norte-americano e dos europeus por mais óleo. Arábia Saudita e Iraque, gigantes mundiais da exportação de petróleo, estão em consenso com outros membros, incluindo a Rússia, na redução de 2 milhões de barris de petróleo por dia. No campo geopolítico foi uma derrota dos EUA de Joe Biden, que vinha pressionando a Opep+ para um aumento de produção. Este posicionamento da Opep+ sinaliza o alinhamento com a Rússia por parte dos países produtores de petróleo.
Quanto à questão técnica, existem gargalos e limitações de infraestrutura de gasodutos e regaseificação de gás natural liquefeito (GNL). Algumas regiões da Europa utilizam gás canalizado, com a infraestrutura do suprimento e distribuição energética desenvolvida ao longo do tempo para alimentar a malha conectada aos gasodutos russos. Outras regiões possuem terminais de GNL, como infraestrutura energética, que atendem cerca de 40% da demanda total de gás atual. De qualquer forma, sejam por gasodutos ou navios metaneiros, o gás natural precisa chegar aos Estados-membros.
Dentro do continente europeu, as produções offshore do Mar do Norte surgem como as únicas possibilidades de ofertas internas para o aumento substancial de gás nos lares e indústrias europeias. E medidas já foram tomadas.
As três nações produtoras de petróleo e gás do Mar do Norte – Dinamarca, Noruega e Reino Unido - estão impulsando suas produções visando atender as necessidades domésticas de energia da União Europeia.
O Reino Unido impulsionou suas exportações e nos últimos meses grandes volumes de gás natural foram enviados em auxílio aos vizinhos europeus. Produtores de gás do Reino Unido aumentaram as produções domésticas em 26% no primeiro semestre deste ano. Novos campos de gás do Mar do Norte, no setor do Reino Unido, como o Campo de Tolmount e o projeto Saturno Banks foram impulsionados para aumentar a oferta e ajudar a baixar os preços da eletricidade. No entanto, o governo britânico não se encontra otimista. O risco significativo de escassez de gás no inverno é uma possibilidade. Embora a Rússia tenha participação pequena no consumo interno britânico - somente 4% do gás consumido são provenientes da Rússia – a emergência interna e a contribuição, quando possível, aos países da União Europeia consomem em quase sua totalidade a produção mensal de gás natural do Reino Unido.
O novo governo britânico já se posicionou quanto ao atual momento europeu. A estratégia de Rishi Sunak, primeiro-ministro do Reino Unido desde 25 de outubro de 2022, é apoiar projetos de petróleo e gás do Mar do Norte e desenvolver a inserção de energias renováveis o mais rápido possível.
A Noruega, o principal produtor do Mar do Norte, e atualmente o maior supridor de gás natural europeu, se comprometeu em maximizar as entregas para a Europa. O primeiro-ministro da Noruega, Jonas Gahr Store, e a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, em recente reunião em Bruxelas se comprometeram na ajuda mútua para aumentar a infraestrutura necessária para maximizar a produção e a distribuição de gás aos europeus.
A Noruega possui uma produção interna que atinge cerca de 3% da demanda global e contribui com cerca de 25% da demanda de gás da União Europeia. Através de sua rede de gasodutos de cerca de 8.800 quilômetros a Noruega distribui gás natural aos terminais de recebimento na Alemanha, Reino Unido, Bélgica e França. Outros países europeus também importam gás natural norueguês. Aproximadamente 95% do gás produzido pela Noruega é transportado por sua rede de gasodutos e apenas 5% são exportados na forma de GNL.
Em termos geopolíticos, este acordo vai muito além do fornecimento de gás aos países membros da União Europeia. A Noruega visa dobrar a infraestrutura de exploração e produção de seu setor petrolífero e se posicionar como o principal fornecedor energético da Europa, ocupando assim o lugar da Rússia. A União Europeia visa neste acordo a participação norueguesa na implementação de tecnologias renováveis através de empresas norueguesas que estão bem adiantadas nesta tecnologia.
Outro movimento político a ser destacado ocorreu em setembro último. Líderes da Polônia, Noruega e Dinamarca enfraqueceram a importância estratégica do gás russo ao inaugurar o gasoduto Báltico. Este gasoduto, entre o Mar do Norte e a Polônia, será vital na estratégia polonesa para se desvincular por completo dos russos.
A era do domínio russo no campo de gás está chegando ao fim.
O certo é que segurança energética e inclusão de tecnologias de baixo carbono somente serão possíveis com a integração energética entre os países europeus.

*Luis Augusto Medeiros Rutledge é engenheiro de petróleo e possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Analista de Geopolítica Energética, Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal e Membro do CERES - Centro de Estudos das Relações Internacionais. Atua como colunista e comentarista de geopolítica energética do site Mente Mundo Relações Internacionais. Pós-graduando em Relações Internacionais pelo Ibmec. Possui 16 anos de experiência em Projetos de Pesquisa e Desenvolvimento entre a UFRJ e o CENPES/PETROBRAS. Colaborador de colunas de petróleo, gás e energia em diversos sites da área. Contato: rutledge@eq.ufrj.br