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A Turquia de Erdogan

No poder desde 2003, Recep Erdogan vem promovendo grandes mudanças institucionais na Turquia, principalmente desde 2010, e essas mudanças vêm acompanhadas de acusações de perseguição de políticos, jornalistas e minorias (principalmente os curdos), censura, e o fechamento de diversos jornais e rádios de oposição ao governo.

O partido AKP (Adalet ve Kalkınma Partisi)  ou Partido da Justiça e Desenvolvimento está no poder na Turquia a mais de treze anos (desde 2002). Ele surgiu em 2001 a partir de uma dissidência do islâmico Partido da Virtude. É considerado um partido conservador moderado, busca o livre mercado e a entrada do país na União Européia. O partido prega o secularismo, apesar de ter relações próximas com diversas organizações islâmicas.

Após vencer a sua primeira eleição, o AKP promoveu adotou uma postura pró mercado e pró Estados Unidos, e promoveu diversas reformas estruturais com foco na economia, para aumentar o crescimento e diminuir a inflação.

Porém esses primeiros anos de bonança, união entre secularistas, religiosos e nacionalistas, e grande popularidade conseguida por Erdogan foram mudando de face, a partir da última década.

Em 2011 o AKP sofreu mudanças internas, comandadas por Erdogan e seus aliados, que excluíram os antigos líderes e fundadores rivais ao presidente. Houve também uma aproximação do partido com os militares, em prol de um ideal de luta contra separatistas e terroristas.

Em seguida o governo promoveu realocação e demissão de funcionários públicos contrários ao governo, segundo o jornalista turco Yavuz Baydar 70% do judiciário e 50% das forças policiais foram demitidos ou realocados. Também dificultou reformas que em algum nível poderiam afetar a hegemonia do partido nas eleições locais e nacionais.

Essas mudanças impostas pelo AKP e sua maioria no legislativo demonstraram a tendência de Erdogan em centralizar o poder em torno de si e de seus aliados (sunitas, nacionalistas, militares e conservadores).

As reformas promovidas causaram revolta na oposição, consideradas por eles autocráticas. Os protestos estouraram no país inteiro e tiveram seu ápice em Istambul, na Praça Taksim, que reuniu todo tipo de gente que sofreu de alguma maneira com o governo do AKP como acadêmicos, esquerdistas, ex-aliados, minorias, entre outros.

A partir deste momento, o governo também começou a impor um controle ferrenho sob os grupos midiáticos e jornalistas, perseguindo, prendendo e censurando os que são seus opositores. Aprovou-se uma lei sobre a internet que dá ao governo o poder de bloquear acesso a qualquer conteúdo que deseje sem ordem judicial.

Ele fechou jornais e conseguiu impor a vontade do governo aos grandes grupos televisivos sob pena de terem o direito de transmissão cassados. Chegou ao ponto de no final de 2015 a invasão e fechamento de uma rede de televisão ser transmitida ao vivo durante quase 24 horas. Os ataques a grupos midiáticos oposicionistas por partidários de Erdogan se transformaram em algo comum.

Erdogan também mudou sua política em relação às minorias, de uma tentativa de pacificação com os curdos, para unilateralmente cortar qualquer tipo de negociação e começar a atacar o Curdistão sob justificativa da guerra contra o terror. A segurança do cidadão é menos importante do que a segurança do Estado. Usou a Guerra Civil Síria como justificativa para abrir um front de combate ao PKK e os curdos.

Promoveu também mudanças legais em relação às forças de segurança (Homeland Security Law), garantindo mais poder a polícia e aos governadores, conseguindo imunidade total para as ações do serviço secreto turco (MIT).

Devido a todas essas mudanças promovidas pelo governo do atual presidente da Turquia, sua relação com os ocidentais vem sendo abalada nos últimos anos. Todas as denúncias de perseguição e aprisionamento de oposicionistas, jornalistas e curdos, além das reformas centralizadoras que estão transformando o país de uma democracia para uma autocracia, minaram toda a possibilidade de entrada na União europeia, pois o país já não se enquadra mais nos critérios da Convenção de Kopenhagen.

Mesmo o país fazer parte da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e ser um aliado dos ocidentais na Guerra da Síria e de suma importância para lidar com a atual crise migratória, além de ser um grande adversário do Irã, os recentes acontecimentos vem fazendo com que os Estados Unidos da América comecem a questionar a participação do país na Aliança Militar.

Erdogan se aproveita da caótica situação no entorno do Mediterrâneo para assumir o controle total da Turquia sem sofrer as consequências de seus atos no cenário internacional, pois o Ocidente depende muito de seu apoio e influência para conseguir lidar com os problemas da região, especialmente em relação à Síria, Irã e os refugiados de guerra.

A sua recente proximidade com Israel também lhe garante o apoio de um dos maiores players do Oriente Médio, apesar de a oposição falar com essa aproximação se deve ao presidente estar atrás do now-how israelense para lidar com os curdos da mesma maneira que eles lidam os palestinos na Faixa de Gaza.

Resta saber por quanto tempo seus aliados e parceiros ocidentais vão aceitar os mandos e desmandos de Recep Erdogan, que ao que parece pretende controlar a Turquia através de um “presidencialismo absolutista” e tentar competir com Alexander Lukachenko (ditador da Bielorússia) pelo posto de líder a mais tempo no poder na Europa.

Referência bibliográfica

BAYDAR, Yavuz. Erdogan has all but destroyed Turkish Journalism. The Guardian. 20 de março de 2015. Disponível em:  http://www.theguardian.com/commentisfree/2015/mar/20/recep-tayyip-erdogan-destroyed-turkish-journalism

BAYDAR, Yavuz. Palestra: A Turquia sobre Alta Tensão. Seminários iFHC. Instituto Fernando Henrique Cardoso. São Paulo, 2016.

TRENKAMP, Oliver. Protests in Turkey: Taksim square belong to us”. Der Spiegel. 4 de Junho de 2013. Disponível em: http://www.spiegel.de/international/world/portraits-of-anti-erdogan-demostrators-in-turkey-a-903658.html

Fonte da imagem:CreativeCommons

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