A nova ordem multipolar, ou o que se entende pelo início de uma multipolaridade, tem como uma de suas características novos arranjos em acordos e relações internacionais, como a intensificação de blocos regionais, parcerias intra blocos, criação de novos modelos de cooperação e aproximação entre Estados e organizações. Podemos afirmar que essa nova estruturação do sistema global tem sido mais evidente com o fim da Guerra Fria e mais acentuada no pós crise financeira de 2008, que demonstraram a queda da União Soviética, na ordem bipolar, e a fragilidade crescente da economia do Estados Unidos, já no final do século XX e início do século XXI.
Dentro desse contexto, novos atores internacionais passaram a buscar e a reivindicar maior relevância dentro do sistema internacional e das configurações na balança de poder, com destaque para o grupo inicialmente BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) e que posteriormente teve a entrada da África do Sul, se tornando BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e South Africa). Sem dúvidas que os países que compõem o grupo são de extrema relevância para as agendas globais, ainda que haja uma disparidade em alguns indicadores entre eles, existe uma agenda de obterem maior impacto e peso nas negociações dentro da comunidade internacional.
Nesse jovial século XXI, o Brasil se torna destaque pela sua pragmática política externa, retomada depois de um forte alinhamento com os Estados Unidos, nos tempos de ditadura militar (1964 - 1984), votando a busca por novas alianças e parcerias estratégicas com o chamado sul global, inaugurando a chamada diplomacia SUL-SUL.
Aproveitando de sua excelente imagem internacional, há uma acertada busca por países africanos, uma vez que esses possuem um histórico de rejeição aos Estados Unidos, assim como de muitos ex-colonizadores europeus. Nesse campo se estabelecem ricas parcerias focadas inicialmente em investimento e trocas comerciais, começadas por países historicamente mais alinhados como Angola, Moçambique e Cabo Verde, e ampliadas para políticas internacionais também com a União Africana.
Através da Agência Brasileira de Cooperação (ABC) aprimoramos as relações técnicas e econômicas com Argélia, ajudando a modernizar técnicas na produção de jóias, Benin, Botsuana e Senegal, para melhoria do setor agroecologia e cooperativismos entre pequenos produtores e com Togo aprimorando as técnicas de cultivo e processamento da mandioca. Ainda dentro do escopo da ABC, há hoje um total de 32 acordos, atuando em cerca de 70 projetos em países africanos.
“Temos uma rede de 32 acordos básicos de cooperação técnica com países africanos e com a própria União Africana, que dão suporte a mais de 70 projetos em andamento, sobretudo nas áreas de saúde, agricultura, segurança alimentar e nutricional, pecuária, pesca, educação e capacitação profissional”, ressaltou Maria Laura.
Seguindo a proximidade histórica com o continente africano, o Brasil apoiou a entrada de Egito e Etiópia para o agora chamado de BRICS + (que conta ainda com Arába Saudita, Emirados Árabes Unidos e Irã), assim como defendeu a União Africana como membro pleno do G20 (Grupo das 20 maiores economias do mundo) que se reunirão em Novembro no Rio de Janeiro.
Tivemos em fevereiro a celebração de 100 anos de relações entre Brasil e Egito, assim como a 37ª Cúpula da União Africana, que teve o presidente Lula como discursante em sua abertura, ressaltando o as relações étnicas e culturais que o Brasil tem com a África, assim como incentivando a ampliação de programas bilaterais em agricultura, educação, inteligência artificial, saúde. A retomada das relações, tanto com a União Africana, quanto com países de forma bilateral é uma grande estratégia para diversificar a balança comercial de todos, assim como para fortalecer a liderança brasileira no cenário internacional, ainda mais em uma arena pouco falada e sempre relativizada pelas democracias ocidentais.
O continente africano é fundamental para a política externa brasileira, seja no âmbito do comércio ou de políticas internacionais, seguindo o pilar do pragmatismo e buscando ampliar cada vez mais sua relevância para o sistema global e atuação nessa nova ordem multipolar.
Desde o início do século, alguns países da África vêm conseguindo estabelecer ótimas relações com a política externa chinesa, principalmente em investimentos externos diretos que vão desde infraestrutura, até programas de incremento educacionais. Nesse contexto, o Brasil surge como um ator de peso, considerando-se o histórico de excelentes parcerias, para praticamente todos os países do continente.
A África tem hoje cerca de 1,3 bilhões de pessoas e uma economia diversificada e pujante, com uma capacidade heterogênea cultural e de investimento. Ainda que haja uma disparidade de países como Egito, Nigéria, África do Sul e o grande centro africano, as relações do Brasil são de extrema importância para todos os envolvidos. De um lado temos a busca por maior relevância e impacto nas decisões globais e do outro a evolução de um continente ávido por inserção internacional e investimentos. As relações Brasil - África são de suma importância para o desenvolvimento de uma ordem global multipolar de fato, uma vez que não é possível defendermos a multipolaridade e o estabelecimento de uma divisão mais igualitária do sistema internacional se não contemplarmos o berço da humanidade, o continente africano.
por Bernardo Monteiro
Referências Bibliográficas:
Dados de Comércio Exterior em acesso livre pelo Comex Stat, MDIC
Bernardo Monteiro é graduado em Relações Internacionais pela UNESA e também pós graduado (MBA) em Relações Internacionais pela FGV-RJ; autor do livro: Para uma Estabilidade Democrática, possui formação como analista político internacional; atua como escritor, analista político, pesquisador e divulgador científico sobre: política brasileira, história da democracia, democracias ocidentais e sociopolítica;
foi pesquisador associado do Laboratório de Simulações e Cenários da Escola de Guerra Naval da Marinha do Brasil (LSC-EGN/MB); foi professor convidado para a disciplina Análise de Política Internacional para a graduação em Defesa e Gestão Estratégica Internacional da UFRJ; foi professor de Análise de Política Externa para o I Congresso de Relações Internacionais (I CONRI); foi palestrante e professor sobre política brasileira, análise política, geopolítica, democracias e cenários prospectivos.
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