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Eurocidades e o futuro da paradiplomacia europeia

Inicialmente uma eurocidade era a forma de denominar qualquer cidade europeia, com uma população, atividade econômica ou peso estratégico significativo. Sendo assim tanto capitais como cidades secundárias foram designadas como eurocidades ao longo dos anos.


Sem embargo, a crescente integração do bloco europeu e a desaparição das fronteiras, fomentaram processos complexos na realidade de algumas localidades, com a expansão das áreas de influência e a conurbação de municípios, gerando aglomerados que respondiam de forma harmoniosa frente as mudanças nas dinâmicas regionais, ainda quando pertencentes a diferentes estados da União Europeia, como a Eurocidade Basca formada pelas cidades de San Sebastían (Espanha) e Bayona (França).


Porém somente em 2008 se forma oficialmente a primeira Eurocidade fruto de um acordo entre diferentes municípios de dois países membros da União Europeia. A eurocidade de Verín-Chaves na fronteira entre Espanha e Portugal, formam um núcleo urbano transfronteiriço, que compartilham serviços além de um elevado grau de integração econômica, respondendo de forma conjunta as políticas aplicadas na região. Assim mesmo os cidadãos possuem o chamado Cartão Eurocidade o qual lhes fornece acesso a grande parte dos serviços públicos em ambos os países.


Certo é que este processo não é exclusivo da fronteira luso-espanhola, mas também presente em praticamente toda as regiões fronteiriças do bloco, sem embargo os níveis de integração e serviço mudam sensivelmente assim como a formalização dos mesmos.


No caso da fronteira Espanha-Portugal, a mesma sofreu poucas variações desde o Tratado de Alcañices de 1297, o que fomentou uma certa estabilidade na região, que após o processo de integração da União Europeia, se transformou em um foco para projetos de integração local.


As cidades localizadas a ambos os lados da fronteira, possuem fortes características em comum, sejam estas históricas, culturais, linguísticas ou econômicas.


Na região conhecida como “A Raia” , localizada entre Galicia e o norte de Portugal, o galego (língua oficial da comunidade autônoma espanhola homônima) e as variantes dialectais do Baixo Minho são resquícios de uma língua antiga em comum (Galaico ou Galaico-Português), havendo até mesmo movimentos reintegracionistas que desejam voltar a unificar ambas as vertentes, assim mesmo o passado histórico da região possuem o mesmo berço, já que integravam uma parte do reino Suevo formado no século V após a desintegração do Império Romano do ocidente.


Ao longo das décadas as atividades agrícolas foram paralelas, sendo comum ver as mesmas plantações a ambos os lados do rio Minho que serve de fronteira natural. Atualmente duas cidades industriais exercem influência na região, a espanhola Vigo ao norte e a portuguesa Viana do Castelo ao sul, embora no caso português a zona de influência poderia se estender até Braga ou Porto, já existem projetos para a construção de uma linha de trens de alta velocidade que unifique esse eixo, já no caso de Galicia a cidade de Ourense e Santiago ( sede do Governo da Região, onde até mesmo existe uma academia de letras portuguesa) também possuem forte vínculos com o país luso, além da futura integração com o sistema de trens de alta velocidade da Espanha em Ourense.


Em meio a essa área de influência se localiza a segunda eurocidade da região, Tui-Valença que junto a outros pequenos vilarejos, formam um núcleo urbano de 169 km2 e mais de 35 mil habitantes que vivem em harmonia e de forma integrada, longe das discussões semânticas e historiográficas que pautam as relações entre ambos países.


Fruto desse processo de integração, outras eurocidades vão se configurando na Raia, o que levou a aprovação da criação de uma Euro-região que integra Galicia ao Norte de Portugal.


A Euro-região Galicia-Norte de Portugal ou INTERREG está dentro do marco do Programa Operacional de Cooperação Transfronteiriça Espanha-Portugal e do Programa Europeu de Desenvolvimento Regional e permite a ambos países e a União Europeia centralizar seus esforços e políticas, e ao mesmo tempo promove uma maior projeção de forma conjunta da área, visando reduzir os desequilíbrios e as assimetrias fruto da centralização tão típica dos estados membros da bloco, que por sua vez promovem uma concentração nos grandes núcleos urbanos em detrimentos de outras regiões, sendo praticamente impossível competir isoladamente com outras cidades como Madri, Lisboa, Barcelona, etc.


E assim como a paradiplomacia começou com a geminação de cidades no território europeu, a criação de núcleos urbanos integrados formados por cidades de diferentes estados ou países, que compartilham serviços e infraestrutura pública, além de atividades econômicas, ações e políticas representam uma evolução na própria forma de se relacionar e se projetar dos municípios conferindo aos mesmos maior competitividade e permitindo um maior equilíbrio diante de um mundo cada dia mais urbanizado e concentrado em grandes regiões metropolitanas que absorvem a maior parte dos recursos e que consequentemente afetam o desenvolvimento de outros pequenos municípios que estão fadados a perder competitividade caso não estejam unidos.


No caso do Brasil, temos regiões fronteiriças, principalmente na fronteira entre Rio Grande do Sul e Uruguai que também possuem iniciativas nesse sentido e que sem dúvidas podem ser uma alternativa a tão sonhada integração do Mercosul ou ao menos uma ferramenta de combate a concentração do capital em grandes cidades.


Wesley Sa Teles Guerra, atuou como consultor internacional na área de Paradiplomacia para o Escritório Exterior de Comercio e Investimentos do Governo da Catalunha. Formado em Negociações e Marketing Internacional pelo Centro de Promoção Econômica de Barcelona, Bacharel em Administração pela Universidade Católica de Brasília, Especialista pós-graduado em Ciências Políticas e Relações Internacionais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo – FESPSP, MBA em Novas Parcerias Globais pelo Instituto Latino-americano para o Desenvolvimento da Educação, Ciência e Cultura, MBA em Marketing Internacional pelo Massachusetts Business Institute e Mestrado em Políticas Sociais em Migrações na Universidad de La Coruña (España). Fundador do thinktank CERES – Centro de Estudos das Relações Internacionais. Especialista em paradiplomacia, acordos de cooperação e transferência acadêmica e tecnológica, smartcities e desenvolvimento econômico e social. Membro do Smartcities Council, IAPSS International Association for Political Sciences Students, Aliança Europa-Latina para Cidades e ECPR European Consortium for Political Research. Morou na Espanha, Itália, França e Suíça. Atualmente cursando doutorado na Espanha na área de Relações Internacionais. Atual colaborador do IGADI, CEIRI e REDEss, pesquisador associado do IGADI - Instituto Galego de Documentación y Analísis Internacional. Autor do livro. Cadernos de Paradiplomacia.

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