Flexibilização em Tempos de Tensão: O Novo Rumo do Mercosul
- CERES
- 14 de abr.
- 3 min de leitura
Diante da nova ofensiva tarifária dos Estados Unidos sob o governo Donald Trump, marcada por aumentos significativos sobre importações de vários países e, especialmente, sobre produtos chineses. O Mercosul vem adotando uma postura cautelosa, porém estratégica, para preservar sua competitividade e adaptabilidade no cenário internacional.
Flexibilidade tarifária
A principal resposta do bloco foi a decisão de ampliar em 50 categorias os produtos que podem ser isentos temporariamente da Tarifa Externa Comum (TEC). Isso permite que cada país-membro aplique tarifas próprias (geralmente mais baixas) nesses produtos, oferecendo margem para negociações bilaterais, inclusive com os Estados Unidos, sem depender do consenso regional.
Essa medida visa dar aos países do bloco maior liberdade de ação em um contexto de instabilidade global. A decisão foi considerada razoável por especialistas, como o uruguaio Ignacio Bartesaghi, já que permite flexibilidade comercial sem romper com o espírito de integração regional.
Pressões internas e discursos divergentes
Internamente, o Mercosul enfrenta tensões políticas. O presidente argentino, Javier Milei, vem criticando abertamente o bloco, acusando-o de beneficiar desproporcionalmente a indústria brasileira e até sinalizando que poderia abandonar a união aduaneira. Apesar disso, a Argentina tem sido uma das vozes mais ativas na defesa da flexibilização das regras internas do bloco, justamente para permitir maior autonomia comercial dos países.
Ainda assim, a diplomacia regional vem mantendo um tom conciliador. O chanceler brasileiro Mauro Vieira afirmou que as decisões recentes foram tomadas em clima de cordialidade e confiança, buscando fortalecer o Mercosul e torná-lo mais dinâmico diante de "grandes desafios globais".
Planos futuros: modernização e novos acordos
Além das medidas emergenciais, os chanceleres também estão focados em uma agenda de modernização do bloco. A reunião ministerial, realizada na primeira quinzena de abril/2025, em Buenos Aires, resultou no compromisso de:
• Discutir propostas de modernização do Mercosul nas reuniões do Grupo Mercado Comum em abril;
• Preparar novo encontro de chanceleres em 2 de maio;
• Avançar nas negociações externas com prioridade para acordos com o EFTA (países europeus não pertencentes à UE) e com os Emirados Árabes Unidos, buscando concluí-los ainda neste semestre;
• Reforçar o compromisso com acordos já celebrados, como o com Singapura, e valorizar a conclusão das negociações com a União Europeia.
Essas ações mostram uma clara tentativa de ampliar o alcance global do Mercosul e torná-lo menos dependente de mercados tradicionais, como os próprios Estados Unidos ou a União Europeia, ao mesmo tempo em que tenta se posicionar como um ator relevante em novas frentes comerciais.
O Mercosul está reagindo às tarifas impostas pelo governo Trump com uma estratégia de flexibilização controlada, que busca conciliar a necessidade de autonomia nacional com a preservação da coesão regional. Essa decisão sinaliza um reposicionamento do bloco, que reconhece as limitações do modelo de integração mais rígido adotado em décadas anteriores e, ao mesmo tempo, procura adaptar-se às pressões comerciais externas sem romper com os fundamentos da união aduaneira. Ao permitir que os países-membros ajustem pontualmente suas tarifas, o Mercosul oferece aos seus integrantes instrumentos de resposta individualizada, especialmente importantes no contexto de negociações bilaterais com potências como os Estados Unidos.
Trata-se, portanto, de um movimento de equilíbrio estratégico: preservar a unidade e relevância do bloco regional, ao mesmo tempo em que se cria margem para ajustes internos e maior agilidade diante de um sistema global cada vez mais competitivo, fragmentado e dominado por políticas comerciais agressivas. O Mercosul, assim, tenta reposicionar-se não apenas como um mecanismo de integração sul-americana, mas como um ator flexível e adaptável no novo tabuleiro global.

João Pedro Nascimento, bacharel em Relações Internacionais, com pós-graduação em Políticas Públicas. Atua como editor-chefe de um site especializado em análises internacionais e tem experiência em tradução, mediação de negócios e cooperação internacional. Fluente em inglês e espanhol, já colaborou com empresas e organizações em contextos multilíngues e multiculturais.
Redes sociais:
Instagram:
Referências bibliográficas
COTRIM, A. Mercosul se reúne para avaliar potencial acordo com EUA pós tarifaço. Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/colunas/amanda-cotrim/2025/04/11/ministros discutem-flexibilizacao-do-mercosul-em-buenos-aires.htm>.
COTRIM, A. Em meio a tarifaço, Mercosul aumenta categorias de importações. Disponível em: <https://noticias.uol.com.br/colunas/amanda-cotrim/2025/04/11/em-meio-a tarifaco-mercosul-aumenta-categorias-de-importacoes.htm>.
SWISS INFO. Mercosur ampliará excepciones arancelarias ante guerra comercial de Trump. Disponível em: <https://www.swissinfo.ch/spa/mercosur-ampliar%C3%A1- excepciones-arancelarias-ante-guerra-comercial-de-trump/89151342>.
Comments