Na geopolítica do Oriente Médio, a estratégia do Irã de se alinhar com atores não estatais, provoca um momentâneo equilíbrio no poder regional. Enquanto, a Arábia Saudita exerce sua tradicional liderança geopolítica sob a benção norte-americana, os iranianos não escondem suas profundas relações com Hezbollah, Hamas e Houthis.
O Irã é considerado o principal patrocinador estatal do terrorismo, fornecendo todo tipo de apoio aos grupos extremistas alinhados com suas ideias. Apesar do líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, ser o líder político do Eixo da Resistencia, como são denominados os três grupos regionais, cada grupo mantém sua própria agenda e base de apoio local, funcionando mais como parceiros do que representantes.
O Eixo da Resistência é uma associação de atores que estão dispostos a cooperar com Teerã em diferentes graus, muitas vezes com objetivos diferentes em mente. É certo, no entanto, que eles não esperarão por um sinal da capital iraniana para cada uma de suas ações.
O entendimento da relação entre o Irã e cada membro do Eixo de Resistência é único. Essa relação entre um ator estatal e atores não estatais, embora raramente envolvam controle absoluto, também demonstram a habilidade do Irã em se posicionar geopolítica diante de grupos extremistas que não seguem as normas diplomáticas internacionais.
O Irã alcançou sem dúvida um sucesso estratégico com o Eixo da Resistência, conseguiu construir uma aliança militar que se posiciona como contrapeso ao poder israelense e americano no Oriente Médio.
O Irã vê a atual tendência de crescente conflitos no Golfo Pérsico como o resultado da forte presença política de Israel, enquanto países árabes estão em desencontro. Teerã acredita que seu papel regional está finalmente sendo estabelecido e legitimado, proporcionando um terreno fértil para a reconciliação regional. Na visão das autoridades iranianas, os desenvolvimentos regionais após as revoltas árabes posicionaram o Irã como um ator geopolítico dominante no Oriente Médio.
O encontro diplomático de 2023, mediado pela China, onde Irã e Arábia Saudita selaram as novas relações internacionais entre seus países, demonstrou a inclinação da Arábia Saudita e de outros países árabes em melhorar os laços com o Irã e a consequente aceitação do país xiita como um ator regional indispensável.
Muito prejudicado internacionalmente por sanções impostas ao país, o Irã, que possui limitações de comercio exterior, se adaptou para perseguir seus interesses de segurança em meio ao caos e crises regionais. Embora Teerã apoie o estabelecimento de um mecanismo de segurança regional, reconhece que os EUA não se retirarão completamente do Oriente Médio em um futuro próximo e está ciente de que os países do Golfo também buscam expandir seus laços de segurança com Washington.
A questão que se coloca daqui pra frente é como o Irã vê o futuro da região após a sucessivos conflitos e como as relações bilaterais com seus rivais regionais serão daqui para frente, especialmente a Arábia Saudita. O Irã vê a estabilização da segurança e o desenvolvimento econômico em toda a região como interligados. A estabilização da segurança no Oriente Médio depende de uma cooperação econômica significativa entre os atores regionais e do desenvolvimento coletivo.
Um novo Médio Oriente está a emergir à medida que atos terroristas no Mar vermelho envolvem duas potências regionais, sauditas e persas, e uma nova guerra sem limites entre Israel e Hamas se desenrola ao mesmo tempo. Essa transformação ocorre após um período de extenso envolvimento militar dos EUA na região, o surgimento do Soft Power chinês, as revoltas civis da Primavera Árabe, o surgimento e declínio do Estado Islâmico e uma série de conflitos por procuração, onde atores não estatais representam o Irã.
Os atuais conflitos podem ajudar o Irã. Na ausência de diálogos construtivos com grupos extremistas, Teerã pode construir um papel, se souber aproveitar a oportunidade, de conciliador. Em consequência, novos laços econômicos, diplomáticos e políticos nos níveis bilateral e multilateral podem se abrir.
As tensões dos últimos meses, podem respingar na negociação mediada pela China no último ano. O país tem muito a perder se não cultivar os laços recém estabelecidos.
Fora do mundo árabe, os Estados Unidos, a União Europeia e a China podem desempenhar um papel construtivo na estabilização da região. Como parceiro estratégico da maioria dos países do Golfo Pérsico, a China pode desempenhar um papel ativo na expansão dos laços multilaterais entre o Irã e os países árabes do Golfo.
Enquanto isso, o Irã tenta jogar suas melhores cartas e conduzir sua geopolítica regional e liderar remotamente novos conflitos que se desenrolam no Oriente Médio continuará sendo considerado uma pária dentro da esfera mundial.
O país desempenha um papel fundamental na expansão ou limitação dos conflitos em curso. Surge uma oportunidade para redefinir o Irã na geopolítica mundial. A decisão está nas mãos do líder supremo do Irã, Ali Khamenei.
Luis Augusto Medeiros Rutledge
Engenheiro de petróleo formado pela UNESA e possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pós-graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo IBMEC.
Pesquisador da UFRJ, Analista de Geopolítica Energética e Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal.
Colunista do site MenteMundo.
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