O crescimento econômico do Uzbequistão e a política externa antiterrorista
O Uzbequistão não está entre as maiores potências mundiais, sua área é 19 vezes menor que a do Brasil e a população desse país é equivalente a do estado de São Paulo. O IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) é considerado médio, tem apenas o 73º maior PIB (Produto Interno Bruto) do mundo, e uma renda per capita que não ultrapassa US$ 2.500,00 anuais. Para quem não se interessa pela Eurásia, ou não gosta muito de geografia, fica difícil até precisar de fato aonde o Uzbequistão está localizado no globo, já que o país raramente ganha notoriedade nos jornais ou em qualquer outro meio de comunicação em massa.
Para muitos, é um país de nome esquisito, como todos os seus vizinhos que terminam com “ão” e que faziam parte da União Soviética. Desde a década de 1990, o Uzbequistão não obteve nenhum desempenho de destaque na região, muito menos mundial. Em meio a esse quase anonimato, o país governado por Islam Karimov conquistou um lugar de destaque no relatório do Banco Mundial deste ano, que elegeu a nação como uma das 13 economias que mais se desenvolvem no planeta, ao lado de países como Moçambique, Myanmar e Etiópia.
Ao que parece, é nesse cenário emergente que a vocação uzbeque para a exportação de energia, além de zinco, cobre, tungstênio, chumbo, prata e ouro, vem colocar o país como uma peça central no desenvolvimento da Eurásia. Aliás, considerando a localização do Uzbequistão, não seria exagero dizer que a nação faz parte do coração energético de uma região complexa nos mais diversos aspectos. Sua vocação para a venda de gás dá ao país o privilégio não só de uma potencial ascensão econômica, mas também eleva seu status quo na escalada para um diálogo mais equilibrado com as potências europeias e orientais. É desse modo que o Ministério das Relações Exteriores do Uzbequistão age de forma central para o desenvolvimento do país.
Para garantir que o Uzbequistão continue a crescer como um ator importante para da Rota de Energia eurasiática, a Politica Externa uzbeque tem como diretriz a cooperação internacional, seja ela econômica ou diplomática, e a busca pela pacificação regional, sendo esse um aspecto sobressaliente de sua relação com o sistema internacional. A paz e a cooperação seria favorável para a solidificação da economia uzbeque na dinâmica do livre-comércio. Mesmo sendo considerado um país com alta intervenção estatal na economia, a sua relação comercial com outros países é baseada nos princípios da economia liberal. Enterrando ao menos de forma parcial a sua herança comunista.
Atualmente, o país mantém relações diplomáticas com 133 nações, inclusive o Brasil. Entre os objetivos principais da Política Externa do Uzbequistão estão o fortalecimento da independência e soberania da nação, o aumento do papel do país na política internacional, o desenvolvimento de uma economia nacional sustentável e dinâmica, a progressão para a construção de um estado aberto e democrático assim como a criação de condições favoráveis para o fortalecimento da segurança nacional e regional. É nesse último aspecto que devemos voltar nossa atenção.
Para a globalização, a garantia do livre fluxo entre as fronteiras é essencial para a economia global. Conflitos regionais, dificultam o acesso entre os países assim como diminui o incentivo para investimentos estrangeiros. Em 2012, o senado do Uzbequistão aprovou um novo documento de diretriz para a Política Externa do país, no qual fica clara a aplicação da diplomacia pacífica, tendo como uma das obrigações da Política Externa atual a “preservação e fortalecimento da paz e estabilidade na Ásia Central, transformando a região em uma zona de segurança e desenvolvimento sustentável, assistindo a conquista da paz e estabilidade no Afeganistão”.
Para isso, era preciso desenvolver e fortalecer alianças que proporcionassem a estabilidade entre as nações da região. Além de se posicionar como um importante ator na busca pela paz na região. Sevim e Rosanov destacam o fortalecimento militar da uzbeque nos anos 2000 com o crescimento do o aparato de defesa da nação.
… o Uzbequistão abriga o maior poder militar na região e esse fortalecimento militar certamente cria um espaço para manobrar sua política externa e de segurança para áreas mais independentes e proativas (Megoran 2004) . Desde a independência do Uzbequistão, o país enviou apoio militar à facção pró- governo para a guerra civil tadjique, realizou uma operação não autorizada em território estrangeiro e unilateralmente demarcou e minou as fronteiras do Estado (Fumagalli de 2007, Efegil 2009) . E depois de 11 de setembro, a força militar uzbeque recebeu uma atenção especial das forças norte-americanas e serviu como a primeira entrada militar dos EUA para a região. (SEVIM & ROSANOV)
A relação entre economia e paz no Uzbequistão é visível, e parece ser também necessária para o desenvolvimento do país. Dentro dessa estratégia geopolítica, podemos destacar algumas ações de Tashkent:
Apoio aos Estados Unidos na Guerra do Afeganistão
Em 2001, o Uzbequistão foi a porta de entrada dos Estados Unidos para o Afeganistão durante a caçada a Osama Bin Laden e a guerra contra a Al-Qeada. A aliança militar com os americanos, do ponto de vista estratégico, fortaleceu o posicionamento militar do país na região na busca pelo combate efetivo ao terrorismo na região, principalmente na fronteira com o Afeganistão.
Combate ao grupo terrorista Movimento Islâmico do Uzbequistão (IMU)
O Movimento Islâmico do Uzbequistão (IMU ) é um grupo de militantes islâmicos da Ásia Central. O IMU abraçou anti-americanismo e a agenda anti-ocidental de Osama bin Laden. Entre seus aliados está o Talibã e a Al-Qaeda. O IMU também continua comprometido com seus objetivos originais de derrubar o presidente do Uzbequistão, Islam Karimov, e estabelecer um estado islâmico no Usbequistão. Esse ano, o grupo foi promovido como parte do Estado Islâmico, e se caracteriza como uma das principais ameaças para os objetivos pacíficos que regem à Política Externa de Tashkent. Para combater o grupo, o Uzbequistão trabalha em conjunto com o Paquistão, Afeganistão, Quirguistão e o Tajiquistão, em operações militares como a de 2013, que prendeu diversos integrantes do IMU. Na época, o porta-voz do Serviço de Segurança Nacional Uzbeque, Khotib S., destacou que o país estava preparado para qualquer coisa, principalmente no que abrange o combate ao extremismo religioso. “Nossas armas e treinamento especial nos guiará a repelir qualquer agressor. Nós passamos por treinamento em montanhas e desertos; a moral de nossos soldados é tremenda porque nós os treinamos com as técnicas mais modernas”, afirmou Kohtib S. ao site Central Asia Online.
Acordo antiterror com a China e o RATS
Em dezembro de 2014, o Uzbequistão fortaleceu seu voto com a China de cooperação ao combate do terrorismo. O Uzbequistão tem papel central no RATS (Regional Anti-Terrorist Structure) da Organização de Cooperação de Xangai. Entre as ações programadas em conjunto está o combate às forças terrorista do IMU, assim como crimes entre fronteiras e traficantes de drogas. A aproximação com a China visa também o fortalecimento da relação econômica entre os dois países, com a consolidação da Rota de Energia.
Apoiar o acordo nuclear do Irã
Em abril desse ano, o Ministério das Relações Exteriores do Uzbequistão lançou uma nota parabenizando os esforços de um acordo com o Irã para a aprovação do desenvolvimento do programa nuclear do país para fins energéticos. Na nota, o ministro ressaltou o posicionamento da nação para o fortalecimento do estado de paz, e pediu que as normas do documento que selava o acordo fosse claro para esse objetivo.
O Uzbequistão não é apenas uma economia emergente, mas seu posicionamento em relação ao sistema internacional também coloca o país como um importante ator nas relações diplomáticas da Eurásia. O trabalho do Ministério das Relações Exteriores em manter o território livre da ameaça terrorista, assim como influenciar para a manutenção da paz na Ásia Central, eleva o status de poder de Tashkent, não só em relação aos países da região, mas como na luta global contra o terrorismo.
Essa clara diretriz da Política Externa uzbeque visa garantir a fluidez econômica na Ásia Central, e também fortalecer o aposte ao investimento de capital estrangeiro. Além do gás, o que parece é que o soft power uzbeque na busca pela paz pode fazer diferente no desenvolvimento social, econômico e diplomático na região. Similar ao Brasil e a Suíça, o país preza por sua independência de posicionamento político, apontando sempre o caminho da neutralidade, o que o faria apto para contundentes negociações diplomáticas.
Desse modo, a diplomacia do Uzbequistão pode ser caracterizada como uma carta na manga de Tashkent na consolidação do seu posicionamento regional.
REFERÊNCIAS
Ministry of Foreing Affair of the Republic of Uzberquistan – Foreing Policy. Disponível em <http://www.mfa.uz/en/cooperation/policy> e <http://www.mfa.uz/en/press/statements/2015/04/4295/
The Islamic Movement of Uzbekistan – Down but not out Disponível em <http://foreignpolicy.com/2012/11/20/the-islamic-movement-of-uzbekistan-down-but-not-out>
The Economist “Here comes Trouble” Disponível em <http://www.economist.com/node/13837440>
The Investigative Project on Terrorism Disponível em <http://www.investigativeproject.org/profile/133>
World Bank Disponível em <http://databank.worldbank.org/data//reports.aspx?source=2&country=UZB&series=&period=>
Santander Trade Disponível em <https://en.santandertrade.com/establish-overseas/uzbekistan/investing>
Uzbek senate approves law on foreign policy concept Disponível em <http://en.trend.az/casia/uzbekistan/2060218.html>
Uzbekistan: Recent Developments and U.S. Interests Disponível em <https://www.fas.org/sgp/crs/row/RS21238.pdf>
SEVIM, Tugce Varol. ROSANOV, Alexander. Ups and Downs in Foreign Policy of Uzbekistan towards Security Approach of Russia Disponível em <http://jhss-khazar.org/wp-content/uploads/2014/06/2NEW-tUGCE-VAROL-SEV-M.pdf>
China, Uzbekistan vow to strengthen anti-terror cooperation. Disponível em <http://news.xinhuanet.com/english/china/2014-12/02/c_127271005.htm>
What Uzbekistan Owes Its Antiterror Allies. Disponível em <http://www.wsj.com/articles/SB1003355019289438040>
Uzbekistan: A Peek Inside an SCO Anti-Terrorism Center.Disponível em <http://www.eurasianet.org/node/65960>
Uzbekistan, a key layer in the post 2014 scenario. Disponível em <http://www.ispionline.it/sites/default/files/pubblicazioni/analysis_263__2014_0.pdf>
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