A extrema-direita é uma realidade cruel na Europa. Embora, não esteja na liderança do poder, possui a partir de agora uma base política influente nos rumos do futuro político europeu para os próximos anos. O resultado das eleições para o Parlamento Europeu tornou os partidos de centro os grandes vitoriosos, sendo o avanço da extrema-direita o grande destaque, deixando a União Europeia com tons mais conservadores.
Os principais vencedores, os partidos de centro-direita e direita, aumentaram significativamente seus representantes, e, mais importante, sua influência junto ao Parlamento Europeu. Vale observar que os resultados eleitorais não representam apenas a perda de força política de Emmanuel Macron e da liderança de Ursula von der Leyen na Comissão Europeia, mas também a possibilidade do retrocesso em questões cruciais que envolvem o cidadão europeu. A força política que se renova, contribui para aumentar as tensões geopolíticas de um continente que se vê espremido entre a Guerra do Leste Europeu e os infinitos conflitos do Oriente Médio.
Uma das principais preocupações quanto ao surgimento de uma nova extrema-direita está diretamente relacionada às lembranças do fascismo no período entre guerras. As atuais referências políticas, fortemente representadas por Matteo Salvini, Giorgia Meloni, Viktor Orban e até mesmo o minúsculo André Ventura, líder do Chega, partido português anti-imigração, são figuras que se identificam orgulhosamente com a direita radical, ultradireita, extrema direita, populismo nacionalista, neofascismo ou, simplesmente, fascismo.
O crescente poder da extrema-direita no Parlamento Europeu e a onda direitista local observada em diversos países membros da União Europeia podem pressionar ainda mais os líderes de governo e a Comissão Europeia sobre as relevantes questões de migração, políticas climáticas e energia.
O bloco europeu recebeu por volta de 1 milhão de pedidos de asilo em 2023 e países que outrora acolheram grande parte dos imigrantes, hoje sofrem as consequências do aumento populacional. A resistência à imigração continua a ser uma das principais bandeiras políticas da extrema-direita europeia. De fato, os imigrantes, aos olhos cegos da direita europeia, tendem a ser vistos por parte dos cidadãos europeus apenas como beneficiários de subsídios estatais, indivíduos que privam o resto da população de recursos importantes como educação e saúde. Muitos ainda associam o aumento de problemas sociais, como drogas e violência urbana aos extracomunitários. De fato, problemas existem. Países que não souberam absorver muitos migrantes e sua força de trabalho, hoje convivem com severos problemas sociais. A Suécia, para exemplificar, está fazendo uso das forças armadas para lidar com o surgimento de gangues urbanas, antes não existentes.
A entrada de imigrantes, grande parte oriundos da África e da Ásia, produz naturalmente uma parcela pobre para o país acolhedor. Por outro lado, os imigrantes podem trazer uma revigorada e nova força de trabalho, qualificada ou não, que dê uma oxigenada na classe trabalhadora e capaz de suportar um sistema de bem-estar social cada vez mais enfraquecido por uma população em constante envelhecimento.
De fato, a entrada descontrolada de imigrantes capacitados ou não para o escasso mercado de trabalho europeu é um problema urgente que está atrelado a diversos fatores sociais que afetam a vida do europeu. Entretanto, ações e razões históricas, agora na contramão, fazem dos líderes europeus responsáveis por mitigar os impactos e contrastes socioeconômicos crescentes para inserir um extracomunitário no caminho vago da reconstrução de suas vidas.
E, o Parlamento Europeu ao longo dos últimos anos está, através de sua comissão, desenvolvendo uma série de propostas para solucionar as deficiências da política de asilo e migração. Reformas no sistema de asilo, passando pela melhoria da migração legal laboral e a promoção da integração dos refugiados fazem parte do pacote de medidas para atenuar o crescente entrave social e político.
Nos campos ambiental e energético, a eleição para o Parlamento Europeu despejou um balde de água fria no meio científico quanto as futuras ações menos poluentes na Europa. A extrema-direita deve pressionar o mercado das energias renováveis.
Líderes de extrema-direita são favoráveis ao retorno do uso de petróleo, mesmo russo, gás e carvão. A grande representatividade de partidos negacionistas da crise climática põe em risco as fortes medidas adotadas ou ao menos delineadas para o continente pós-guerra da Ucrânia.
Após os partidos de extrema-direita ganharem poder considerável nas eleições europeias, alguns setores, principalmente as empresas de energias renováveis, poderão ser significativamente afetadas por mudanças em políticas energética e climática.
A transição para a energia mais limpa é interpretada pela extrema-direita como um exagero da atual liderança da União Europeia e argumentam que as atuais regulamentações climáticas impõem encargos financeiros significativos aos cidadãos e, principalmente ao setor industrial, forçando aumentos significativos de custos para o cumprimento das metas de emissões.
A segurança energética, um tema recorrente na mesa da Comissão Europeia, será abordado por outro prisma, o aumento do uso de fontes fósseis e o uso abundante da infraestrutura existente. Esta linha de pensamento visa exclusivamente a forte necessidade de uma reindustrialização, onde se utilize todas as tecnologias possíveis de fontes fósseis, incluindo o carvão, sem se aventurar com a intermitência de tecnologias eólica e solar.
Uma consequência imediata da presença de partidos de extrema-direita no Parlamento Europeu deverá ser percebida logo. O iminente atraso a implementação do Pacto Verde.
O Pacto Verde Europeu (Green Deal), compreende um plano de ação para transformar a Europa no primeiro continente climaticamente neutro em 2050, mediante incentivos à economia, qualidade de vida e a proteção da natureza.
Este plano de ação de 50 pontos mira impulsionar o uso eficiente dos recursos energéticos e abrangem todos os setores da economia, com especial destaque para os que geram maior número de emissões, como o transporte ou as indústrias.
Partidos de extrema direita investem na ideia de que a transição energética diminua a força competitiva dos países europeus em relação às principais economias, particularmente os Estados Unidos e a China. Portanto, a sua influência nas políticas energética e climática da União Europeia pretende atingir a redução dos investimentos no setor das energias renováveis, o que exige um apoio governamental ou de uma base parlamentar forte.
A perda de força do partido verde alemão, o crescimento da direita radical de Marine Le Pen e a volatilidade dos preços de energia convergem para impactar as medidas ambientais e forçar o retrocesso climático.
Concluindo, muito embora os efeitos climáticos sejam visíveis e a migração esteja na calçada das grandes cidades europeias, um setor opaco da sociedade europeia se prende ao nacionalismo populista como salvação. Pura negação da realidade.
Luis Augusto Medeiros Rutledge
Engenheiro de petróleo formado pela UNESA e possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pós-graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo IBMEC.
Pesquisador da UFRJ, Analista de Geopolítica Energética e Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal, Consultor da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior - FUNCEX.
Colunista do site MenteMundo.
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