A Venezuela, país rico em petróleo, sofreu a pior crise econômica durante os sucessivos governos de Nicolás Maduro. O resultado das eleições deste ano poderiam ser um divisor de águas e livrar o país das sanções econômicas imposta pelos EUA à sua riqueza mineral, além de evitar o êxodo do país de milhões de migrantes em busca de melhores expectativas de vida.
As últimas duas décadas de política econômica fracassada e a implosão das instituições democráticas acompanhadas por denúncias constantes de corrupção eleitoral afetaram profundamente o povo venezuelano. A oposição sempre apontou para as políticas de Maduro o fator responsável pelo colapso econômico. Enquanto, Maduro acusa diretamente os EUA, país responsável pelas sanções ao petróleo local que foram impostas em 2019.
No campo geopolítico, a vitória de Maduro, contestada pela oposição e por países vizinhos, dificulta ainda mais o caminho dos EUA por maior influência na América Latina e aproxima ainda mais Caracas de seus tradicionais aliados: China, Rússia e Irã.
No caso particular do Irã, as relações de Maduro com os líderes religiosos de Teerã preocupam. A figura política de Maduro foi fundamental para a grande potência xiita do Oriente Médio expandir sua influência para outros países sul americanos. No primeiro semestre deste ano, Bolívia e Irã fortaleceram suas relações bilaterais, com cooperação estratégica em diversos setores. Importante destacar que o acordo entre os governos da Bolívia e Irã no campo militar incluiu a transferência de drones para vigilância de fronteiras, semelhante ao que já ocorre na Venezuela.
Sempre discreta, a China, um aliado silencioso, sempre apoiou pela manutenção do regime bolivariano no poder, de Chávez a Maduro. Ao longo dos últimos anos, Pequim intensificou o apoio econômico e político-diplomático, demonstrando claramente ser um aliado do atual governo da Venezuela.
A China, através de soft power, apoiou Maduro em todas as áreas. Passou a comprar o petróleo de Caracas quando o embargo dos EUA estava em curso. A partir deste momento, a dependência da Venezuela em relação à China tornou se cada vez mais evidente. Sendo o principal credor do governo venezuelano, a China aumentou sua influência no governo venezuelano. Os empréstimos mantiveram e salvaram a produção futura de petróleo. O fluxo foi enorme: US$ 62 bilhões.
Em contrapartida, o governo da Venezuela apoiou a China em todas as questões centrais da política externa chinesa e acompanhou a cadeira de Pequim em importantes votações da ONU. O reconhecimento de Taiwan como uma parte inalienável da China, a Lei de Segurança Nacional de Hong Kong e as disputas territoriais no Mar da China Meridional são alguns exemplos dos acordos políticos desta relação bilateral. Assim, os interesses estratégicos de cada lado foram garantidos.
Em se tratando de Rússia, a perda da cadeira presidencial por Maduro colocaria em risco a projeção de poder de Putin na América Latina. A Venezuela é um forte aliado diplomático da Rússia. Os governos compartilham o interesse em enfraquecer o poder dos EUA no continente sul-americano. As duas principais esferas da política externa russa na Venezuela são a energia e a venda de armas, onde, em termos geoestratégicos, a Rússia e a Venezuela são exemplos claros de "nacionalismo de recursos", ou seja, governos exercem o controle total sobre os recursos naturais em seus territórios.
O nacionalismo venezuelano dos recursos petrolíferos se destacou durante os estágios iniciais da Revolução Bolivariana, quando a estabilidade econômica dependia fortemente da extração de petróleo e recursos minerais (Bremmer e Johnston, 2009). Uma visão geoestratégica fortemente apoiada por Putin.
A Venezuela é um petroestado, onde a receita do governo é profundamente dependente da exportação de petróleo e gás natural. A economia do país depende fortemente dos reservatórios de hidrocarbonetos. No entanto, a falta de investimentos em infraestrutura nos setores de exploração e produção de óleo e gás veem, ao longo dos anos, afetando drasticamente a governança do país.
O colapso da economia venezuelana e do setor petrolífero tem implicações regionais e internacionais significativas, que vão desde fluxos migratórios sem precedentes até o colapso das trocas comerciais.
Como grande produtor internacional de petróleo – em 2008 a Venezuela foi o 3º maior produtor – seus números de produção e posições políticas foram, até 2014, fundamentais para alcançar o consenso entre os membros da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP). Isso ajudou a alcançar um equilíbrio entre os interesses das monarquias do Golfo Pérsico e o resto dos membros da organização. Hoje, o país apresenta sérios problemas em termos de produção mundial de petróleo e com as sanções impostas, está perdendo seu caráter internacional, diante da OPEP e das monarquias da Península Arábica.
Os resultados eleitorais não devem mudar o panorama do desenvolvimento de setores estratégicos e das finanças públicas da Venezuela. O país, hoje, é alvo de protestos contra o governo e paralelamente se observa o aumento da temperatura política após o processo eleitoral.
Parte da comunidade internacional, cobra mais transparência do país após o suspeito resultado que manteve Maduro no poder. Enquanto isso, a tropa de choque formada por China, Rússia e Irã já sinalizaram positivamente ao resultado das eleições.
Igual ao resultado eleitoral, o amanhecer na Venezuela continuará incerto.
Luis Augusto Medeiros Rutledge
Engenheiro de petróleo formado pela UNESA e possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pós-graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo IBMEC.
Pesquisador da UFRJ, Analista de Geopolítica Energética e Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal, Consultor da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior - FUNCEX.
Colunista do site MenteMundo.
Referência Taylor & Francis, The Rise and Fall of Resource Nationalism, Ian Bremmer & Robert Johnston, Pages 149-158 | Published online: 24 Mar 2009.
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