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Balanço da Africa

  • Foto do escritor: CERES
    CERES
  • 24 de mar.
  • 8 min de leitura

Muitas vezes desconhecido, o continente africano esta numa evolução constante muitas vezes despercebida. 

Nesse sentido se torna importante fazer um balanço de dinâmicas e do contexto africano como um todo para entender o que esta acontecendo, neste “espaço de jogo” das potências internacionais


Um breve apanhado do contexto econômico


Porém, apesar das tendências gerais que serão aqui apresentadas, não podemos iniciar sem relembrar alguns pontos essenciais: 


  • O continente é um território colossal que poderia abrigar a Europa, a China e os Estados Unidos juntos.

  • Suas paisagens se estendem desde as dunas escaldantes do Saara até as florestas tropicais da Bacia do Congo, a segunda maior floresta do mundo depois da Amazônia.

  • Com seus 54 estados soberanos o continente é formado por “um quebra-cabeça” de inúmeras culturas e idiomas praticados por quase um bilhão e meio de habitantes 

  • Sua demografia, até 2050, uma em cada quatro pessoas será africana, e um em cada dois africanos terá menos de 25 anos, uma população jovem ávida por construir e consumir, e um mercado enorme e de rápido crescimento que já está atraindo cobiça. 


Se continuamos em uma perspectiva meramente econômica, o continente representa um terço dos fosfatos do mundo, 50% do cobalto, 24% do ouro, 45% dos diamantes e 17% do urânio consumido anualmente no mundo. 


O Zimbábue sozinho, em breve, será capaz de atender a 20% da demanda mundial de lítio, e o Congo tem as maiores reservas do mundo, muito à frente do atual líder, a China. Por fim, Nigéria, Angola, Argélia e Egito já estão produzindo petróleo e gás, e abrigamas as duas primeirais representam 12% e 8% das reservas comprovadas, respectivamente. 


Desde a virada do século, todo o continente vivencia um crescimento econômico excepcional, embora variando de região para região, mas, diante de tais marcos, não hesitamos mais em falar de milagres africanos. 

Hoje, 8 dos 10 países que registraram o maior crescimento do mundo no ano passado são africanos, liderados pelo Senegal, com 8,2%, e pelo Níger, com 11,2%. 

 

Para o continente como um todo, o crescimento médio de 4,8% entre 2000 e 2010 foi impulsionado pelo aumento dos preços das commodities. Entre 2011 e a crise sanitária o crescimento foi em média de 3,1%, o que é superior à média mundial. 


Em 2024, a economia africana registrou um crescimento de mais de 3,4%, e deve continuar assim em 2025, chegando a 3,8%, com crescimento maior na África Ocidental do que na África Central ou Austral.  

Os campeões econômicos africanos são a África do Sul, o Egito, a Argélia, a Nigéria e a Etiópia. Esses cinco países registraram um PIB combinado de  2.000 bilhões no ano passado. Se adicionarmos os 10 países seguintes (em termos de PIB), teremos mais de 3.000 bilhões USD de riqueza gerada na África - isso é mais que a França. 


A maior empresa do continente é uma companhia de petróleo argelina chamada Sonatrach com faturamento de mais de 77 bilhões de USD em 2024, seguida no pódio pela Nigerian National Petroleum Corporation com faturamento de mais de 19.3 Bilhões.


Também surgiram líderes em várias áreas - comunicações, por exemplo, com 18 países confiando nos serviços do grupo MTN a operadora sul-africana já vale mais de 11 bilhões de dólares americanos na bolsa de valores de Joanesburgo. 

Podemos também citar grupo nigeriano Dangot líder no seguimento do concreto em todo o continente, seguido pela Lafarge Africa, ou marroquina OCP forneceu mais de 11 bilhões de dólares de fertilizantes fosfatados para os agricultores do mundo.

A Escom da África do Sul está classificada entre 10 maiores fornecedores de eletricidade do mundo. 


Construção de energia e telecomunicações, mas também mineração, turismo, produtos farmacêuticos, finanças e indústria agroalimentar, todos esses setores registraram um forte crescimento em 2024 permitindo de esqueça os efeitos da pandemia.


A África está lançada a “toda velocidade” na via do desenvolvimento e, se fizermos uma lista, ela tem tudo de que o mundo precisa: terras férteis, água doce, minerais raros essenciais para a transição ecológica e o desenvolvimento de tecnologias, além de uma população jovem que representa o futuro do consumo global.



Os parceiros estratégicos e econômicos


A Europa, que durante muito tempo teve uma relação complexa com o continente, inicialmente brutal e dominadora, em um sistema em que os africanos eram relegados à condição de nativos e explorados sem qualquer outra consideração. Esse passado, que deixou sua marca, pesa muito hoje nas relações entre os dois continentes.

Após a descolonização, a Europa quis manter sua influência por meio de laços econômicos, culturais e diplomáticos, mas muitas vezes com uma postura moralizadora que se tornou cada vez mais impopular. A França, em particular, viu-se rejeitada por várias de suas ex-colonias, acusada de interferência e de ter tratado “seus parceiros” africanos com condescendência.

Essas dificuldades permitiram a outros parceiros, como a China, de ocupar um novo espaço principalmente nos últimos 15 anos quando ultrapassou a França como principal parceiro econômico.


A Europa está a tentar recuperar espaço e fortalecer suas relações por viés de programas tais como Global Gateway, com 150 bilhões de euros em investimentos durante seis anos, ou seja, 25 bilhões de euros por ano. Enquanto a China, do outro lado anuncia 45 bilhões de euros apenas para 2024. A Europa não tem como prometer de uma parceria de iguais, sem o peso de seu passado colonial e sua postura desde a descolonização. Desde o início do milénio a China está avançando na África com uma estratégia terrivelmente eficiente - uma aliança de soft power, investimento maciço e controle estratégico de infraestruturas. 

Em 2022 ela ganhou um terço dos contratos de construção de infraestrutura superiores a 50 bilhões de USD contra somente 12 % para as empresas ocidentais. Com a iniciativa da Nova Rota da Seda, ela está financiando e construindo estradas como a Nairobi Expressway no Quênia portos e ferroviárias entre Djibuti e Adis Abeba ou entre Nairóbi e Mombaça infrasestrutura de energia como a usina hidrelétrica de Mombya na Nigéria, no valor de 4,9 bilhões de dólares. Ela se estabeleceu como o parceiro essencial no desenvolvimento de muitos países, como a República do Congo, Djibuti, Angola, Quênia, Etiópia e África do Sul. 


Em paralelo, também está investindo pesadamente em soft power, construindo universidades, financiando mídias e oferecendo bolsas, de acordo com fontes a 500.000 estudantes. Contamos com dois milhões de cidadãos chineses em solo africano, quase o dobro dos europeus.


Mas por detrás desses grandes projetos e colaborações frutíferas existe “uma armadilha” na qual toda a estratégia chinesa se baseia: a dívida. 

Pequim oferece o pacote completo de financiamento, a construção e, muitas vezes, somas astronômicas foram concedidas aos países africanos. A Etiópia e o Djibuti, por exemplo, devem à China o equivalente à metade de seus PIB, enquanto Angola, Zâmbia, Gana e Quênia também estão dificuldades no reembolso desses empréstimos. O país devedor se compromete a entregar as instalações financiadas a operadores chineses e foi assim, por exemplo, que o porto de Hambantota foi “entregue” à China Merchant Ports quando o Sri Lanka não pode quitar sas dividas em 2017. Até o momento, não houve casos desse tipo na África, nem mesmo quando a Zâmbia deixou de receber um pagamento de 2 bilhões USD em 2020.


Enquanto a China soube “fechar” bem seus contratos, garantindo seu acesso aos recursos africanos e fortalecendo seu controle financeiro. Outros estados como a Rússia não escolheram o caminho do dinheiro. O seu trufo  vem dos seus grupos paramilitares privados (Afrika Korps ex Wagner) que estão implantados em vários países em crise, como Mali, República Centro-Africana e Sudão, fornecendo proteção para regimes locais e assegurando recursos e instalações estratégicas em troca de acesso privilegiado a minas de ouro, diamante e urânio. A Rússia, porém, não para por aí, está aumentando o número de acordos militares, vendendo armas, treinando soldados  ganhando a confiança de vários governos que estão “fartos” das exigências ocidentais. Por fim, ela joga habilmente a carta da influência mediática ao denunciar o neocolonialismo europeu e promover uma aliança entre nações livres contra o Ocidente, o que não é nem mais, nem menos do que a promessa dos BRICS. Todo o continente africano agora faz parte do que é conhecido como a aliança dos países do Sul, uma aliança informal de economias, em sua maioria emergentes, que buscam se libertar da pressão ocidental.


Ao contrário da Europa ou da China, os Estados Unidos nunca fizeram da África uma prioridade estratégica. Focados durante muito tempo com o Médio-Oriente e a Ásia, cederam espaço a outras potências e permitiram que elas fizessem essa aproximação entre países do Sul Global. Mesmo assim, não estão totalmente ausentes: multinacionais como a Microsoft e o Google estabeleceram operações no continente, aproveitando a mão de obra barata e regras trabalhistas menos exigentes. Os satélites da Starlink cobrem grande parte do continente, e a USAID e a Fundação Bill e Melinda Gates estão trabalhando para garantir que a imagem do “Tio Sam” seja positiva, com graus variados de sucesso. 

O Departamento de Estado também está investindo em programas de ajuda e desenvolvimento. Os fundos americanos financiam as start-ups africanas e as ONGs promovem a democracia e os direitos humanos com uma retórica sedutora quanto irritante. Obviamente todo esse quadro pode mudar por completo com a suspensão provisoria dos programas da USAID decidida por Trump. 

A grande diferença com outros é que não há apoio militar, nem nenhum programa de obras e de infraestrutura de grande porte. A América tem outras prioridades


Os desafios


A Africa, apesar do seu crescimento espetacular, tem vários desafios “gigantes” para resolver nas próximas décadas. Se a sua demografia é uma vantagem ela também é um problemática por impõe resolver questões sobre emprego, educação, saúde, energia e urbanização.


Hoje, 600 milhões de africanos ainda não têm acesso à eletricidade, 313 milhões não têm acesso à água potável e 163 milhões estão ameaçados pela falta de alimentos. Isso é espantoso para um continente que abriga 65% das terras aráveis do mundo, mas que sofre com a seca, o desmatamento e o uso de métodos agrícolas tradicionais que limitam sua capacidade produtiva. 

Além disso, outro grande desafio: muitos países africanos precisam sair da armadilha da renda oriunda das matérias-primas - em outras palavras, precisam urgentemente diversificar suas economias. Os recursos minerais e os hidrocarbonetos representam 60% das exportações e 28% do PIB do continente. 


O petróleo representa assim 90% das receitas de exportação da Nigéria, 95% das de Angola e 100% das da Líbia. Além disso, os minérios são responsáveis por 90% das vendas de exportações da República Democrática do Congo, Botsuana depende dos diamantes para 80% de suas vendas e a Zâmbia só vive do cobre. 

Por fim, Burquina Faso, Mali, Benim e Chade são grandes produtores de algodão, responsáveis por até 70% das exportações. 

Essas economias mono exportadoras são, por natureza, mais vulneráveis, portanto, precisam começar a buscar outras fontes de renda e criar valor localmente por meio do desenvolvimento de indústrias locais e da competitividade e isso com urgência para enfrentar esses grandes desafios 


Enquanto a Europa perde mais terreno a cada dia e os Estados Unidos olham para outro lugar, os governos dos países africanos pretendem encontrar soluções com os novos parceiros do BRICS. A organização já conta com a África do Sul, o Egito e a Etiópia e cerca de trinta outros países africanos já manifestaram interesse. Neste contexto não podemos ficar surpresos de ver esses dirigentes cederem às propostas chinesas e russas capazes de financiar grandes obras, compartilhar saberes e garantir a segurança de um território onde a violência ainda está muito presente. 


De acordo com Índice Mundial Global de 2024, se a Europa é o continente mais pacífico, apenas dois países africanos estão oficialmente em paz: Botsuana e Madagascar. 

A OCDE também nos diz que os últimos cinco anos foram os mais violentos já registrados no norte da África e na África Ocidental. As guerras civis, os protestos populares e os conflitos entre minorias estão se multiplicando perigosamente e as situações estabilizadas são, muitas vezes, frágeis. A população tem uma grande demanda por segurança e estabilidade política sem mencionar que, sem paz e apesar de tudo a África tem a oferecer, é impossível fazer negócios a longo prazo o caminho ainda será longo, mas com belas perspetivas.



Marco Alves, Internacionalista - Burkina Faso
Marco Alves, Internacionalista - Burkina Faso



Bibliografia



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