Lítio, minerais críticos e a nova geopolítica energética
- CERES
- 14 de mar.
- 4 min de leitura
Luis Augusto Medeiros Rutledge
Geopolítica Energética
A transição energética requer um aumento significativo no fornecimento global de minerais críticos, entretanto, fatores políticos, econômicos e estratégicos colocam as cadeias de suprimentos expostas a uma série de riscos geopolíticos.
Para atender a demanda global projetada para os próximos anos, gargalos de produção e refino de minerais críticos devem ser superados em caráter de urgência. O alto risco de interrupção na cadeia de suprimentos está diretamente condicionado à geopolítica energética e muito pouco ao desenvolvimento de novas tecnologias para geração de energia limpa.
Em particular, a indústria do lítio é de grande importância para a segurança energética, a defesa nacional e um potencial transição global para a energia limpa, impulsionada por seu papel essencial em baterias de veículos elétricos e, principalmente, sistemas de mísseis, fundamentais aos Estados Unidos, China e Rússia. E, se as projeções de demanda para a energias limpas se confirmarem ainda mais, isso fará do lítio um metal estratégico, e a luta internacional pelo controle de suas reservas e produção e enriquecimento aumentará mais do que antes.
Embora os Estados Unidos tenham recursos significativos de lítio, a China é o player dominante indiscutível nas áreas de baterias para veículos elétricos e sistemas de armazenamento de energia em geral a partir deste elemento químico. Portanto, fortalecer uma cadeia de suprimentos de minerais críticos fora da China é fundamental para países da União Europeia e Estados Unidos. Ao novo líder norte-americano, as reservas de minerais críticos são estratégicas.
Donald Trump não faz rodeios ao se declarar para a indústria do petróleo. Sua estratégia visa intensificar a demanda por óleo e gás e, ao mesmo tempo, retardar ao máximo o avanço da transição energética. E, para isso, o atual governo norte-americano precisa criar meios de controle acerca das reservas de minerais críticos, sinalizando sua intenção de explorar esse ativo na corrida global pelo domínio tecnológico e energético.
Para liderar a transição energética na velocidade desejada é imprescindível o controle sob fornecedores confiáveis. E, neste caminho, o novo governo norte-americano deverá repensar completamente sua política de lítio ao lidar com outros países, concentrando-se no triângulo de lítio. Em particular, o triângulo do lítio, que inclui Argentina, Bolívia e Chile, abriga mais de 50% do suprimento mundial de lítio, e o acesso a esses suprimentos dependerá em grande parte da política internacional.
Porém nem tudo são flores para o governo Trump. O triângulo do lítio tem se tornado cada vez mais o foco das atenções das principais potências mundiais, e a China está de olho no maior fornecedor conhecido de lítio, a planície de sal Salar de Uyuni da Bolívia, enquanto a Rússia assumiu o controle do Salar Bastos Grande naquele país.
A produção de lítio está concentrada em um número limitado de países, liderados pela Austrália, e o chamado triângulo do lítio para os produtores, enquanto as empresas chinesas controlam metade da produção global de lítio e mais de 70% da fabricação de baterias de íons de lítio.
As reservas geográficas limitadas e centralizadas de lítio podem criar uma futura escassez no fornecimento de lítio, forçando os países a buscar a segurança do lítio obtendo controle independente sobre os suprimentos.
A geopolítica do petróleo em muito se assemelha com a geopolítica das energias renováveis, pois a visível distribuição global desigual dos recursos de lítio demonstra que não há integração vertical entre os países e, portanto, muitos países consumidores de óleo e gás estenderão suas necessidades energéticas para acessar esses recursos e ficarão mais expostos aos riscos geopolíticos do mercado de energia.
A segurança energética implica na garantia de reservas de lítio, seja produzindo localmente ou investindo em sua produção no exterior. A corrida para garantir o lítio está ocorrendo nos níveis mais altos, com países como os Estados Unidos priorizando o acesso aos materiais necessários para fazer baterias longe dos combustíveis fósseis. Em contrapartida, a necessidade da China de aumentar seu fornecimento de lítio é urgente, pois abriga o maior mercado mundial de veículos de nova energia.
Contrariando a lógica de Trump, a competição geopolítica tornará necessário que os Estados Unidos expandam e melhorem as cadeias de suprimentos hidrelétricas e de lítio, e seria um erro geopolítico grosseiro por parte dos Estados Unidos ignorar essa dimensão.
Um fator decisivo será o papel desempenhado por Elon Musk em Washigton. O excêntrico conselheiro de Trump, possui interesse pessoal no lítio por causa de sua indústria automobilística e, assim, também será um fator crucial a ser considerado sob o governo Trump.
A política externa do governo Trump 2.0 adotou uma abordagem decisivamente inflexível com imposição de tarifas comerciais provocando reações imediatas da China. Quase que de imediato, o governo chinês proibiu a exportação de metais vitais para os Estados Unidos.
O caminho norte-americano será tortuoso, uma vez que a China soube ao longo dos últimos anos aumentar seu soft power em regiões estratégicas à sua economia. As empresas chinesas estão espalhadas na África, onde controlam em grande parte a mineração de cobalto, e essas empresas são estatais chinesas ou empresas de capital misto com capital privado de investidores chineses de lugares como Cingapura e Hong Kong.
Essa visão estratégica de negócios em países de alta volatilidade e risco, permite que a China assuma desafios dos quais as empresas ocidentais estão alienadas. Vale destacar que a República Democrática do Congo é um país altamente inseguro politicamente num emaranhado de conflitos violentos com tropas ruandesas, país onde as empresas chinesas têm interesse em se tornar o principal ator estrangeiro.
De certo, o tensionamento nas relações comerciais e políticas entre China e os Estados Unidos irá influenciar na configuração da geopolítica energética dos próximos anos.

*Luis Augusto Medeiros Rutledge é Engenheiro de Petróleo e Analista de Geopolítica Energética. Possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Pós-graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo IBMEC. Atua como pesquisador da UFRJ, Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal, Consultor da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior – FUNCEX, Colunista do site Mente Mundo Relações Internacionais e autor de inúmeros artigos publicados sobre o setor energético.