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Tunísia se equilibra entre históricas relações internacionais e as novas perspectivas geopolíticas

Luis Augusto M. Rutledge


O cenário atual de um mundo multipolar e de busca por maior equilíbrio geopolítico, expõe a atual dificuldade de alinhamento político dos governos do Norte da África: seguir com suas históricas relações socioeconômicas com nações ocidentais ou abraçar as novas perspectivas políticas e investidas econômicas oriundas das potências orientais, especialmente Rússia e China.  


Nesse contexto, analisar a Tunísia, país independente desde 1956 e, hoje, uma das nações mais desenvolvidos da África se faz necessário. Historicamente, a Tunísia possui relações comerciais profundas com as principais economias da União Europeia. Entretanto, os crescentes sentimentos antiocidentais estão cada vez mais aflorados no Norte da África, influenciados não somente pelos pesados investimentos em infraestrutura econômica, social e urbana, oriundos das bandeiras russa e chinesa e muito pelo posicionamento ocidental pró-Israel.


Os laços entre o Norte da África e a Europa são de longa data, especialmente para a Tunísia.  O ex-protetorado francês possui estreitas relações comerciais com a própria França, Itália e Alemanha, principais parceiros comerciais dentro da União Europeia, além de ser um importante aliado geoestratégico dos países membros da OTAN. 


O Norte de África é uma região com uma enorme importância geoestratégica. Situada entre África, Europa e Oriente Médio, o controle europeu da região terrestre africana e do Mar Mediterrâneo sempre esteve relacionado à segurança dos países do sul da Europa e, mais ainda, dos gasodutos que alimentam há décadas a demanda energética europeia de gás natural. Uma mudança política do governo tunisiano em busca de maior amplitude geopolítica poderia fortalecer a posição da Rússia na região do Mar Mediterrâneo.


A Rússia aumentou nas últimas décadas sua influência no Norte da África, considerando a região de importância global para suas rotas comerciais. A mudança estratégica da Rússia em direção ao norte da África ocorreu após as sanções de anexação da Crimeia em 2014 e cresceu após a guerra da Ucrânia em 2022. Muito influenciada pela ruptura de suas fontes energéticas na Europa, a Rússia de olho na nova formatação do mercado global de energia vislumbra ampliar sua posição na África e utilizar as rotas de exportação marítima do Mediterrâneo para menor custo logístico de grãos e energia. 


O interesse da Rússia em países do Norte da África vai além das relações comerciais, pois contempla a possibilidade de adquirir uma base militar permanente ou de contingência, incluindo potenciais localizações na Líbia, Egito, Argélia e, agora, Tunísia. Essas instalações aumentariam a projeção de poder russo no Mediterrâneo e serviriam como uma porta de entrada para o interior africano.


O atual cenário global, nos apresenta um mundo multipolar marcado por dinâmicas competitivas e blocos geoeconômicos fortes, a exemplo do BRICS e da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN). Nessa reconfiguração global, o papel de países como a Tunísia ganha importância sem precedentes. Tanto os Estados Unidos ao lado de países europeus, quanto China e Rússia almejam o controle político e geoestratégico da região de forma segura. 


Embora a União Europeia seja a principal parceira da Tunísia, com as suas relações econômicas que remontam os anos 1970, o país africano vive uma crise alimentar que forçou encontrar soluções para a crise de grãos no solo russo. A crise de grãos da Tunísia, causada por uma escassez de suprimentos devido à guerra da Ucrânia, combinada com um declínio na produção interna como resultado da seca, causou interrupções no fornecimento de farinha aos mercados. Sob pressão para garantir suas necessidades de grãos, 80% dos quais são importados, a diplomacia tunisiana assinou um acordo comercial para o fornecimento de trigo russo.


Tunísia e a União Europeia vivem uma instabilidade política causada pela crescente migração de cidadãos da região do Sahel para o sul da Europa. A migração provocada em grande parte pela insurreição islâmica, fez da Tunísia um país trânsito de imigrantes. 


Sabiamente, a Rússia está se beneficiando deste momento. Isto inclui a promoção do investimento e o desenvolvimento do comércio e propor acordos comerciais que possam levar a Tunísia a diversificar suas relações externas para o leste para envolver a Rússia e a China. Por outro lado, este seria o primeiro passo para concretizar o pedido da Tunísia para se juntar ao BRICS, apenas alguns meses depois de entrar no Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura.


Uma análise simplista indica que a tentativa da Tunísia de se juntar aos BRICS visa a diversificação de sua economia, a aproximação com a Rússia de Putin e diminuir a influência ocidental.


O certo é que a crescente inclinação de nações do Norte da África para acordos comerciais com o Oriente tem motivações diversas. A abertura de oportunidades econômicas e a crescente insatisfação com as políticas ocidentais são as mais predominantes. 


O risco geopolítico da Tunísia, um grande aliado dos EUA fora da OTAN e país geoestratégico no setor segurança, ao mudar suas alianças, será atingir a dinâmica do poder global, remodelando as estratégias geopolíticas e de segurança do Mediterrâneo nos próximos anos.



Luis Augusto Medeiros Rutledge

Engenheiro de petróleo formado pela UNESA e possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Pós-graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo IBMEC.

Pesquisador da UFRJ, Analista de Geopolítica Energética e Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal, Consultor da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior - FUNCEX. 

Colunista do site MenteMundo.


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