top of page
  • Foto do escritorCERES

Disputa Territorial entre Venezuela E Guiana: O Caso Essequibo

INTRODUÇÃO

A persistente disputa territorial entre Venezuela e Guiana, centrada na região do Essequibo, é uma complexa questão que envolve história, direito internacional e interesses políticos e geopolíticos. Rica em recursos naturais, a região tem sido palco de tensões diplomáticas entre os dois países sul-americanos. Este artigo explora as raízes históricas da disputa, os argumentos apresentados por ambas as partes e as tentativas de resolução do conflito.


ANTECEDENTES HISTÓRICOS DA DISPUTA

A origem dessa disputa remonta ao século XIX, quando fronteiras imprecisas foram desenhadas por potências coloniais europeias. Ao longo de 200 anos houve várias tentativas de promover soluções capazes de satisfazer ambos os lados, mas para o direito internacional, disputas territoriais são um tema sensível, principalmente devido ao fator político envolvido. 


De acordo com Nikolic (2017), durante 1777, o império espanhol estabeleceu a capitania geral da Venezuela, esse documento tinha o objetivo de unir províncias antes divididas por fatores políticos, econômicos e militar. Em 19 de abril de 1810 a Venezuela declarou independência e se estabeleceu como um novo Estado. De acordo com a autora, a nova república da Venezuela herdou todo o território que abrangia a capitania até o Rio Essequibo, estabelecido como fronteira ocidental com a Holanda. 


Embora as Guerras Napoleônicas não desencadearam diretamente o processo de independência das colônias na América Latina, é certo que os países colonizadores foram enfraquecidos e isso contribuiu para criar condições propícias para os movimentos de independência na região. Dessa maneira, após o fim das Guerras Napoleônicas em 1814, a Holanda renunciar seus territórios na América Latina e cedeu para Inglaterra. 


É fato que após declarar independência, novos Estados enfrentam problemas para assegurar sua soberania e integridade territorial.  Nesse sentido, Nikolic (2017) explica que para prevenir que colonizadores europeus tentassem tomar seus territórios, as ex-colônias da Espanha e Portugal dividiram todos os territórios e estabeleceram o princípio uti possidetis, que legitimava a divisão fronteiriça com base nesse princípio.


Foi com base neste princípio que a declaração da Grande Colômbia definiu a fronteira entre Colômbia e Venezuela. Se não fosse isso, a Venezuela teria sido anexada ao território da Colômbia. Nikolic (2017) explica que em 1825 o império britânico reconheceu a independência da Gran Colombia, que anexava a Guiana Essequiba, porém Venezuela declarou independência em 1830, que incluía todo o território da Capitania Geral da Venezuela. 


A Inglaterra decidiu violar o princípio de uti possidetis e no ano de 1835 encarregou Robert Schomburgk para desenhar uma nova fronteira que invadia o território soberano da Venezuela. A autora revela que até 1850 a Inglaterra redefiniu a fronteira duas vezes como forma de especular e chantagear a Venezuela. Por fim, Humphreys (1967), afirma que os países assinaram um tratado que obrigava a Inglaterra a não ocupar o território de Essequibo. A Inglaterra não cumpriu pois descobriu minas de ouro. Durante a guerra civil, a Inglaterra redesenhou a fronteira pela terceira vez em 1887, enquanto a Venezuela estava desestabilizada pela guerra civil. 


ARGUMENTOS LEGAIS E ARBITRAGEM INTERNACIONAL 


Em 1897, um acordo de arbitragem entre a Grã-Bretanha e Venezuela foi assinado. Entretanto, de acordo com Nikolic (2017), Venezuela não teve representantes próprios durante a arbitragem. Seus representantes foram nominados pela Suprema Corte dos Estados Unidos que no final decidiu em favor da Inglaterra, apoiando a linha de Schomburgk como fronteira. 


Segundo a autora, a Grã-Bretanha se baseou no argumento de que antes da independência venezuelana a Espanha não havia proclamado posse do território de Essequibo e que a Venezuela nunca teve soberania sobre o território. Portanto, a sentença Arbitral de Paris decidiu por unanimidade que a separação deveria considerar a divisão feita por Schomburgk. 


Por outro lado, a Guiana afirma que o tratado é legalmente vinculativo, sendo tacitamente reconhecido pela Venezuela por muitos anos. Além disso, alega ter estabelecido posse efetiva da região ao longo do tempo, desenvolvendo infraestrutura e governança.

Desde então, A Venezuela argumenta que foi pressionada a aceitar o tratado devido à sua fragilidade política e econômica e baseia sua reivindicação na herança histórica e no princípio do uti possidetis, defendendo fronteiras conforme divisões geográficas e étnicas pré-existentes.


A decisão foi influenciada politicamente pelos EUA e Inglaterra, desconsiderando a soberania venezuelana. O Tratado de Washington de 1899, mediado pelos Estados Unidos, estabeleceu limites entre Guiana Britânica (atual Guiana) e Venezuela. A Venezuela nunca o reconheceu completamente, alegando coerção e defendendo negociações bilaterais para determinar as fronteiras reais.


Após a Segunda Guerra Mundial, a Venezuela levou a questão para debate internacional durante a Assembleia Geral da ONU em 1962. Após isso, só em 1966 Venezuela e Grã-Bretanha assinaram o Acordo de Geneva que reconhece a disputa pelo território de Essequibo e estabelece procedimentos para solução pacífica de controvérsias, prevista no Capítulo VI, artigo 33 da Carta das Nações Unidas (1945). 


Em suma, Esforços da comunidade internacional, incluindo a ONU, não alcançaram uma resolução permanente. Para solucionar a disputa, os respectivos ministros das relações exteriores negociaram, em abril de 1990, o método de bons ofícios. Sendo assim, os países, por meio de representantes, se reúnem periodicamente sob mediação da ONU. 


QUESTÕES GEOPOLÍTICAS DA DISPUTA


Após a descoberta de reservas de petróleo em Essequibo, o presidente atual da Venezuela, Nicolás Maduro, reacendeu a controvérsia, levando o aumento das tensões.  A região de Essequibo oferece acesso estratégico ao mar, facilitando o comércio, a navegação e o posicionamento militar. Para além disso, de acordo com Desiderá Neto (2012), a região disputada é caracterizada por possuir solo rico em recursos minerais, como ouro, bauxita e urânio, e sua costa é abundante em petróleo. 


Embora os recursos naturais estejam entre os principais argumentos da disputa atual, as tensões entre países vizinhos têm o potencial de afetar a segurança regional e o desenvolvimento econômico, além de implicar em questões de soberania e influência política regional sobretudo porque os países envolvidos buscam consolidar suas posições como atores importantes na América do Sul, visando obter maior relevância nas dinâmicas geopolíticas da região.


CONSIDERAÇÕES FINAIS


A complexidade das disputas territoriais torna mais evidente a necessidade de abordagens que busquem alcançar soluções pacíficas e justas. No entanto, a própria conjuntura dos países torna desafiador alcançar tais soluções pacíficas. Um exemplo disso é a atual situação na Venezuelana, marcada por uma profunda crise econômica, que faz pressão política e estimula a disputa, gerando instabilidade no cenário internacional.


Diante do histórico da arbitragem internacional e considerando os interesses geopolíticos das partes envolvidas, as tensões na região de Essequibo demandam uma resolução eficaz e inovadora que considere todos os fatores envolvidos, incluindo as negociações passadas. Portanto, de outra forma, as tensões regionais podem persistir enquanto a questão não for resolvida de forma pacífica e colaborativa.




Anderson Miguel de Oliveira, é internacionalista formado pela Universidade federal do Sergipe. Assessor na Reina Consultoria Internacional e novo membro do CERES, também atuou na AISEC e no mapeamento dos ODS em Alagoas.


REFERÊNCIAS

Desiderá Neto, W. A. (2012). A questão fronteiriça entre Guiana e Venezuela e a integração regional na América do Sul. Conjuntura Austral3(12), 11–25. https://doi.org/10.22456/2178-8839.26359

Donovan, T. (2004). Challenges and the Territorial Integrity of Guyana, Georgia Journal of International and Comparative Law, 32(3), 672.

Humphreys, R. (1967). Anglo-American Rivalries and the Venezuela Crisis of 1895, London, UK: Transactions of the Royal Historical Society.

Nikolic, A. The Guyana Esequiba Conflict: Key Historical Frameworks and Legal Issues. International law, 2017.

ONU. Carta das Nações Unidas. 1945. Disponível em: http://www.onu.org.br/conheca-a-onu/documentos/ - Acesso em 14 de dezembro de 2023. 

SILVA, Gutemberg de Vilhena. “Litígios transfronteiriços na região das Guianas: questões geopolíticas na interface entre a Amazônia e o Caribe”. In: RÜCKERT, A. A.; SILVA, A. C. P. da; SILVA, G. de V. (Orgs.). Geografia Política, Geopolítica e Gestão do Território: integração sul-americana e regiões periféricas. Porto Alegre: Editora Letra1, 2018, p. 199-217 DOI 10.21507/9788563800367-12

bottom of page