Geopolítica: Transição energética e a reconfiguração das relações internacionais dos países árabes
- CERES
- há 1 dia
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Luis Augusto Medeiros Rutledge
Geopolítica e Energia
Enquanto observamos a contínua inserção de novas tecnologias e fontes energéticas para geração de energia limpa, alterações geopolíticas estão em curso, impulsionadas pelas novas configurações das relações internacionais do setor energético global.
De imediato, a transição energética mudará as estruturas de dependência, onde um país produtor de energia renovável e que faça uso de sua produção interna gerada para sua demanda doméstica, poderá afrouxar a influência de países produtores de energia fóssil. Ao mesmo tempo, serão observadas novas relações comerciais e maior proximidade política com Estados que detêm matérias-primas essenciais para a produção de energia renovável. Em especial, o formato de novas parcerias transnacionais dependerá não somente de inovação tecnológica, mas, principalmente, de decisões geopolíticas dos atores envolvidos.
É importante entender que, devido a diferentes interesses dos atores envolvidos, a transição energética avançará de forma desigual em diversos países, independente de fronteiras. Especialmente, porque os países em desenvolvimento continuam a ser fortemente dependentes economicamente dos combustíveis fósseis e os países produtores de petróleo dependentes da receita de exportação de energia fóssil.
Uma prova disto é a questão econômica. O PIB em alguns países exportadores de petróleo está diretamente relacionado às exportações de óleo e gás. Neste seleto grupo alguns países do Oriente Médio e do Norte da África se destacam. As exportações de energia dominam a balança comercial da Arábia Saudita, fornecendo a riqueza que o Reino saudita não procura esconder. A maior parte do petróleo é exportada, deixando o país-membro da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEP) dependente dos preços do petróleo, pois a receita do petróleo é um determinante fundamental da saúde fiscal, moldando os gastos públicos, os projetos de infraestrutura e a posição saudita nos mercados globais. Na mesma posição, os Emirados Árabes Unidos, onde os lucros de petróleo e gás natural ainda contribuem com mais de um terço das receitas do governo, de modo que é improvável que os líderes políticos do país estejam interessados em interromper a produção de óleo e gás natural.
A geopolítica da transição energética pode resultar em relações econômicas completamente novas. Por exemplo, países que até agora tiveram pouca influência em termos de política energética entrarão mais em foco, o que pode levar a novas situações competitivas.
Em países do Oriente Médio e Norte da África (MENA), tradicionais produtores de petróleo e gás natural, há dois desenvolvimentos opostos ocorrendo. Por um lado, os exportadores tradicionais como Arábia Saudita, Catar e Kuwait, continuarão com as dependências existentes na era pós-fóssil, mas necessariamente colocarão investimentos em energias renováveis. Por outro lado, vemos que países como Marrocos e Tunísia poderiam tornar-se menos dependentes das importações de energia através da expansão das energias renováveis.
Historicamente, os países do Golfo Pérsico há muito desempenham um papel significativo no fornecimento de energia e, consequentemente, sendo responsáveis por grande parte da segurança energética global. Agora, a região está emergindo além de seu papel tradicional de ator-chave no mundo dominado por combustíveis fósseis em um potencial impulsionador da transição energética global.
Para manter a balança comercial favorável no setor energético, os estados do Golfo desenvolveram políticas que evoluem em torno de três ordens de interesse energético. Primeiramente, o interesse em reforçar a predominância de combustíveis fósseis no sistema energético global. A segunda é maximizar o espaço para hidrocarbonetos enquanto ainda faz parte das soluções climáticas. A terceira, uma estratégia mais equilibradas dentro da geopolítica energética, é alinhar-se com as políticas convencionais que impulsionam a transição global. Embora, possam parecer estratégias desconexas, os países produtores de petróleo do Oriente Médio estão efetivamente avançando em vários vetores de engajamento em busca de objetivos energéticos aparentemente divergentes e fazendo fortes investimentos no Sul Global em setores de biocombustíveis.
No atual ambiente de incerteza geopolítica, os estados árabes precisam ajustar suas políticas externas para lidar com os riscos geopolíticos e de segurança energética.
As crises globais, onde conflitos geopolíticos complexos alteraram a dinâmica global do fornecimento de energia e forçaram discussões em torno da transição energética, desencadearam grandes mudanças nas prioridades estratégicas de energia dos países da região Oriente Médio e Norte da África. No entanto, as atuais estratégias energéticas terão por obrigatoriedade a formação de parcerias estratégicas com as nações europeias e do Sul Global, polos centrais no discurso da transição energética.

Luis Augusto Medeiros Rutledge é Engenheiro de Petróleo e Analista de Geopolítica Energética. Possui MBA Executivo em Economia do Petróleo e Gás pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e Pós-graduado em Relações Internacionais e Diplomacia pelo IBMEC. Atua como pesquisador da UFRJ, Membro Consultor do Observatório do Mundo Islâmico de Portugal, Consultor da Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior – FUNCEX, Colunista do site Mente Mundo Relações Internacionais e autor de inúmeros artigos publicados sobre o setor energético.
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